sábado, 28 de novembro de 2009

O jornalismo do não fato

A história só merece desprezo, mas eu resolvi dar pitaco e tentar contextualizá-la na pauta das reinvindicações feministas. Não vou atrás do link (mas no Azenha tem o texto completo), mas é a papo do fulano que ouviu, 15 anos atrás, que o Lula teria tentado molestar um carinha outros 15 anos antes, quando estava preso.

Olha, a gente reclama muito porque sabe que vítimas de estupro têm sua moral julgada, e por isso evitam denunciar. Sabe o quanto isso é horroroso, triste, o quanto a lógica machista impera e cala as mulheres. Nesse ponto, homens estuprados, ou como quer a lei, vítimas de atentados violentos ao pudor, também sofrem por conta do machismo. Agora... sem vítima não tem crime, né, galera? E a Folha da ditabranda, virando a campeã universal do bola-fora (Veja e boimate são hours concours, gente), publica uma coisa dessas, tão golpe baixo, tão sem pé nem cabeça.

Então, se a vítima aparece, 15 anos, 30 anos depois, é uma coisa. Não tem como comprovar a materialidade dos fatos, algo fundamental num processo justo, mas ainda tem uma palavra ali. Mas, assim, “o menino do MEP”? O Lula não é o Polanski. E com isso não estou colocando a mão no fogo por nosso presidente, pelo qual não nutro nenhuma simpatia pessoal (apesar de apoiar este governo). Se aparecesse agora uma mulher dizendo que foi estuprada pelo Polanski 30 anos atrás, ele não teria sido preso, porque é muito difícil comprovar um estupro tanto tempo depois, ainda mais quando não se trata de um estuprador em série.

Só que é ainda pior. É “tentou molestar”. Materialidade nenhuma mesmo. De novo: se foi verdade, é horrível, claro. Mas, como saber? É uma palavra contra a outra. Aliás, uma contra várias, porque lá no Azenha mesmo e no Nassif já apareceu um monte de gente pra dizer que essa história não tem pé nem cabeça.

Minha opinião, assim, muuuuito pessoal, é que o fato não é verdade, mas o Lula pode ter contado a história. Porque falastrão ele é, né? Inventar uma história sórdida e contar assim, numa boa, num ambiente privado, como se não tivesse consequências, até combina com ele. Mas o babaca repetir 15 anos depois e a Folha publicar é o fim.

Lembrei do caso Luísa. Olha só, o cara publicou aquilo na Trip. Disse que fez, e depois disse que era ficção. Mas ninguém inventou que ele fez: a gente leu um discurso em primeira pessoa banalizando a coisa, e chegou a uma conclusão. De qualquer maneira, a não ser que a Luísa aparecesse pra denunciá-lo, só se pode repudiar o texto do cara, mas não processá-lo por estupro. No caso do Lula, a não ser que o “menino do Mep” apareça e a gente ouça a versão dele dos fatos, a gente só pode concluir que o César Benjamin é um tremendo safado e/ou (porque uma coisa não exclui a outra) que o Lula fez uma piada de mal gosto e o cara resolveu valorizá-la.

Agora, a Folha querer fazer jornalismo com "ouvi falar 15 anos atrás que 15 anos antes..." é de lascar, né?

Update em 28/11: segundo está dito aqui, era como eu imaginava. A história foi contada, mas era brincadeira. De muitíssimo mau-gosto, aliás: assédio sexual não é nem um pouco engraçado. Lógico que motivo nenhum pra se orgulhar disso, shame on you, Lula. Mas ele contou isso em um encontro privado, não publicou na Trip, e atire a primeira merda quem nunca fez uma piada mórbida qualquer. Então, quem é canalha, o cara que contou a piada ou o que quer usar isso politicamente 15 anos depois?

6 comentários:

  1. Sabe o caso do filho bastardo (acho patetico usar esse termo) do FHC? Então, é isso.

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  2. Haline,

    Acho que não entendi. Porque a história do filho do FHC é comprovadamente verdade e ter um filho fora do casamento não é crime. O interesse público não está em saber se ele teve ou não o filho, mas se teve e a Globo resolveu "fazer o favor" mandar a mãe da criança para o exterior para a história não vazar, o que ele fez pra agradecer esse favor, entende? O grave da história não é o relacionamento extra-conjugal, mas um provável relacionamento pouco lícito com a imprensa.


    Agora estupro é uma questão de polícia, independetemente da posição do cara. Então, estamos falando de algo muito mais pesado aqui.

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  3. Pois é, nuunnnnca falaram do tal filho do FHC, embora a imprensa toda já soubesse.

    É o maior descaramento e jogada política isso tudo...E o grande problema aí, ao meu ver, é o jornaleco de meia tigela - de ter publicado o que publicou...

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  4. Iara, lógico que não é crime. Alias, eu não acho nada demais. To dizendo que essa notícia foi plantada pra desmoralizar o Lula, como a outra poderia ter desmoralizado o fhc. Sacou? É pra esquecer o outro caso. Foi até óbvio demais. E baixo demais também. Eu fico sempre impressionada com a capacidade da baixaria.

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  5. Claro, Haline, agora eu entendi. É que seu primeiro comentário foi tão curtinho que não entendi em que ponto a comparação entrava. Eu também sou ingênua, viu? Sempre acho que há limites pra baixaria, mas não há.

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  6. Vanessa,

    Acho um absurdo não terem nunca comentado do filho do FHC também, sabe? E agora sair publicado que ele "assumiu o filho". Ok, tão dizendo que ele sempre sustentou o carinha (pq tem 18 anos, não é criança mais). Mas, pô, viúvo e fora do poder, fica fácil, né? O Genoíno, em campanha pra governador em 2002, falou da filha que tinha fora do casamento, pra não dar espaço pra nenhum escândalo. Tá certo, né? Não pela moralidade ou não da coisa, mas porque todo mundo tem direito de dizer quem é seu pai em voz alta.

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