sábado, 7 de julho de 2012

Memórias gastronômicas de um relacionamento estável


Fui à feira sozinha e na barraca do pastel me dei conta de que se um dia a gente terminar, vou sempre lembrar que seu preferido é pizza (eu cada semana pego um diferente). Se um dia a gente terminar, vou lembrar que além do pastel do sábado, você come também o pastel da feira de quinta-feira, a caminho do trabalho, como café da manhã. Vou me lembrar também que seu café da manhã é, boa parte das vezes, só café e cigarros – que às vezes você varia pra um suco cítrico, o que também não é nada bacana pro estômago (eu e minha gastrite ficamos inconformadas).

Se um dia a gente terminar vou lembrar que você não achava o jantar importante até me conhecer e eu te deixar claro que, se eu não tivesse companhia pra jantar, ficava sozinha. E lembrar que sua resposta foi um suspiro seguido por “beleza. então vou comer menos no almoço”.

Se a gente terminar vou lembrar que você não é muito fã de doces, mas que a vó Erci no seu aniversário faz uma torta de morango pra você e a outra pros convidados. E que eu já levei bronca por comer um pedaço da sua. E vou lembrar do seu apreço pelas papinhas de frutas industrializadas (mas eu sei, você disse que já enjôou delas faz um tempo). Vou lembrar que você e sua família joseense me apresentaram ao bolinho caipira (é bem bom bolinho caipira).

Se um dia a gente terminar vou lembrar que você não gostava de coentro quando a gente se conheceu, e hoje come até na salada. Vou lembrar que você gosta tanto da comida da minha mãe que já foi até lá meio brigado comigo só pra filar o almoço. Mas também vou me lembrar que você é um chato que não gosta de abóbora, nem do doce da minha mãe (melhor, sobra mais). E também não é lá muito fã de mandioquinha (que pra mim é o paraíso em forma de legume). Ai, também não gosta de grão-de-bico, acabei de me lembrar. Porra, você é MUITO chato.

Se um dia a gente terminar vou lembrar que você gosta de cervejas em geral, e da Guinness em especial. E lembrar que os anos na Alemanha o fizeram gostar daqueles salsichões que eu acho sem graça. E que gosta de joelho de porco, e de purê de batata com salsicha.

Se um dia a gente terminar, vou lembrar que temos planos de viagens gastronômicas para o Peru e para o Sudeste Asiático. Pode ser que a gente só termine depois de fazer essas viagens, que hoje ainda parecem tão distantes. Mas a viagem de carro até Ushuaia também parecia um sonho distante e a gente realizou. E nem era uma viagem gastronômica, mas comemos muito bem em alguns lugares (e pessimamente em outros).

Se um dia a gente terminar, vou lembrar que nós dois engordamos desde que nos conhecemos. E que todos esses quilos foram feitos de muito prazer. Vou me lembrar que apesar de eu estar rechonchuda pra mais, você continua dizendo que eu sou gostosa – e se a gente é o que a gente come, eu devo ser mesmo, modéstia às favas.

Se um dia a gente terminar vou me lembrar de uma relação tão deliciosa que não tem porque terminar. Eu não quero que termine. Acho que nem você, né?