terça-feira, 31 de agosto de 2010

Centenário \o/ e inquietações políticas

Então, 100 anos de Corinthians. E eu nem sei porque me tornei corintiana. Meu pai é sãopaulino, mas nunca foi muito empolgado com futebol. Acho que não tem ninguém próximo que justifique meu afeto. Lembranças mais antigas me remetem ao Sócrates. Devo ter ouvido algum comentário elogioso à Democracia Corintiana quando eu era bem pequena, e ficou a simpatia. Que virou amor. Não é nem paixão, é amor mesmo, daqueles que ocupa um lugar certo mesmo sem queimar. E lógico, casar com um palmeirense louco por futebol, viver a coisa da rivalidade dentro de casa todo dia, tornou tudo mais apimentado. Mas é assim independentemente do marido. Eu sei: não tem estádio, não tem Libertadores, e hexa e blábláblá. Não me venham com argumentos racionais. Não é assim que o amor funciona. Eu não deixei de amar quando viramos lavanderia de dinheiro da máfia russa, nem quando caímos. Lamentei muito, mas continuei amando e continuei fiel. E posso reconhecer que deve ser luxo ter galeria de títulos ou um presidente professor da Unicamp. Mas meu coração tem dono.

***

Então vem o lance do estádio. A Mary W postou aqui. E eu acho que ela tem razão em se indignar. É o seguinte: pra quem ainda não sabe, parece que o Lula, notório corintiano, pediu “uma força” pra Odebrecht pra sair esse estádio. Pedir uma força pode não ser crime, mas não existe almoço grátis, e o Lula deve saber disso. Então, se meter numa dessas assim, com sua sucessão quase garantida, é no mínimo temerário. O pior é que eu acredito muito que tenha sido assim. Não tenho esses preconceitos burgueses contra o Lula, mas tenho lá meu pé atrás. Acho que ele é um fanfarrão, e essa é o tipo de fanfarronice que é a cara dele. Então, dei uma broxada geral. Não queria nem o Lula nem o Corinthians envolvidos com isso. Fiquei com dupla vergonha alheia. E chego no trabalho e minha chefe, conservadora e palmeirense, diz que vão chamar o tal estádio de “Luiz Inácio Lula da Silva”. Argumento pra dizer que ela tá falando bobagem? Não tenho. Se acharem aí, me emprestem, por favor. E eu posso até zoar com marido, dizer que eu sou corintiana como o Lula, e ele palmeirense como o Serra, dizer que minha companhia é melhor, mas não é assim que a banda toca. Como eu disse acima, futebol é paixão – e política, pra mim pelo menos, é razão. Uma razão bem dura, aliás.

Meu consolo é que eu acho a Dilma muito diferente disso. Não se parece em nada com ela esse tipo de coisa. Então eu realmente acho que ela pode ser melhor do que o Lula em muitos aspectos. Que a eleição dele foi importante historicamente e tal eu não tenho dúvida. Mas pra mim, deu. Muita popularidade, muito poder, não sei aonde isso leva. Tem gente que vai chiar, dizer que torce pra ele voltar em 2014, como já ouvi por aí. Eu não. O governo Lula não é só o Lula, a gente tem que lembrar disso. A gente não precisa dele no poder pra garantir nada de bom do que foi feito - e nossa democracia só vai estar madura quando isso estiver claro. Ele tem qualidades inegáveis, mas não quero esse super líder populista. Não quero um mito. Tá bom assim, já.

Daí eu lembrei que uns dias atrás eu falei por telefone com meu melhor amigo, que tá envolvido com o PSOL. E foi muito legal a conversa. Marido tinha aberto um vinho, mas ficou pacientemente me olhando e esperando a ligação terminar pra conversarmos, porque ele sabia que eu ia vir com boas observações. E como a gente sabe que tem a Reinaldos Azevedos e Mainardis por aí, trabalha em multinacional com coleguinhas reaças, fica achando que é de esquerda. Mas meu amigo veio, me deu um safanão e me mostrou que eu, na verdade, tô na centro-esquerda. E eu tinha perdido isso de vista mesmo, sabem? E na conversa com ele surgiu uma série de pontos importantes. Que as pessoas estão comprando TV de plasma, mas não têm atendimento médico decente. Que se gasta mais com comida, comprando supérfluos, mas as pessoas estão ficando obesas e subnutridas ao mesmo tempo. Isso porque a gente nem falou do saneamento, esse horror. Enfim, uma série de críticas que precisam ser feitas, que precisam ser ouvidas. Mas meu amigo faz de um ponto de vista marxista com o qual meu discurso já não se afina. Além disso, devo admitir que tenho imensa preguiça de um partido pequeno e já rachado. Se não conseguem se entender entre os próprios quadros, como esperam administrar esse país tão grande? Mas ainda assim, tendo a votar no PSOL no legislativo, porque ando com sede de oposição bem fundamentada. Acho indispensável pra democracia essa oposição tomar corpo pra ontem, viu? Se até o Serra tá tentando convencer a gente que não é oposição, é porque tem um discurso único aí que não é bacana. Longe de ser ameaçador porque a imprensa trata de malhar bastante o governo. Mas que a falta de críticas construtivas é um problema, isso é.

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No mais: TIMÃO-Ê-Ô, TIMÃO-Ê-Ô! \o/

domingo, 29 de agosto de 2010

Natureza, essa sacana

Eu queria ter feito um monte de coisas na semana que passou. Queria ter rendido mais no trabalho, ter lido o meu livro que jaz empacado, queria ter feito pelo menos uns 2 posts. Queria. Mas fui atropelada por uma TPM horrorosa. Uma das piores da minha vida.

Eu não costumo sofrer muito com TPM. O normal são uns 2 ou 3 dias meio resmungona, uma barra de chocolate devorada sem dó em algum momento, um pouco de enxaqueca na véspera (nada que um analgésico não resolva), e um pouco de cólica no dia que a menstruação chega. Mas notem só: sofrer pouco já é um conjunto de sintomas desagradáveis. Eles não chegam a paralizar minha vida, só tornam as coisas mais lentas um pouco, essa é minha referência pra dizer que é leve. Há meses até em que as coisas são bem tranquilas, e eu só lembro que vou ficar menstruada por conta de um outro sintoma que eu não mencionei acima: gases. Daí que eu arroto (desculpem as mais sensíveis), penso "nossa, o que eu comi pra arrotar assim?", e lembro que vou ficar menstruada dali há dois dias.

Já este mês a coisa foi punk-hardcore. Achei que eu não chegaria empregada e casada até o final da semana. Pra manter o casamento, fiquei sem falar com o marido dois dias, porque eu estava irritada por uma coisa pequena, mas sabia que se eu o abordasse, ia superdimensionar e me arrepender depois. Então, eu tenho a vantagem de ter essa lucidez, pelo menos. Eu sei que não estou no meu estado normal. O que não significa conseguir reverter isso, em absoluto. E o trabalho? Já falei que eu não amo de paixão meu trabalho, mas ele é ok. Essa semana fiquei o tempo todo pensando "deu. deu muito. não aguento mais essa merda, vou fugir daqui agora, etc". Na quarta-feira foi o auge. Às 4 da tarde eu queria morrer. Não tô exagerando, eu realmente queria morrer pra parar de sofrer. E tenho uma amiga querida que sofre horrores com TPM. Todo mês fica mais de 10 dias bem mal. Toma até antidepressivo, uma coisa horrorosa. Vem a menstruação e ela melhora. Na quarta eu mandei um e-mail pra ela dizendo que ela merece ser canonizada, porque não sei se suportaria, todo mês, uma semana ou mais, me sentindo como estava na quarta-feira.

Passada a crise, fiquei pensando na carga de sofrimento que nos é imposta pela natureza. Porque isso não é social. O estresse pode até ser piorado pelo estilo de vida e tal. Mas quem não tem nada de TPM também fica dias ali, sangrando. E pra que isso nos serve? A nós mulheres, como indivíduos, nada. Serve à reprodução da espécie. Se eu não tiver filhos, nada disso terá me valido de nada. Daí a religião teve que inventar a Eva, pra justificar essa injustiça natural. Porque a religiao também serve pra isso, justificar o injustificável. E toda a mitologia que constroem sobre o nosso corpo. Tipo, o útero. Não tem outra função a não ser abrigar um bebê. Minha mãe teve de tirá-lo há alguns anos. E o médico preocupado que ela não ficasse ouvindo conversa de que "você vai sentir um vazio", "vai ficar fria", porque não tem absolutamente nada a ver. E ela já tinha dois filhos, não ia ter outros, e tirou, não faz falta alguma. Fora o momento da reprodução, o útero é como o apêndice, só serve pra te dar problema.

Conversei com o marido depois. Ele no começo ficou preocupado, depois bem sensibilizado. E é chato, porque eu agradeço a ele pela paciência, claro, mas me revolto porque não fui eu que exigi essa paciência dele. Não foi voluntário, em absoluto. Eu não escolhi negligenciá-lo a semana toda. Eu tava lá, sofrendo, querendo morrer.

Passou. Sexta a gente ficou discutindo sobre os medicamentos, a discussão do livro da Preciado. Porque eu parei de tomar pílula, um pouco pra desintoxicar o organismo de hormônios. E, sem ela, parece que tudo piora um pouco. Na adolescência, eu cheguei a desmaiar de tanta dor por conta das cólicas. Acreditem, eu sou uma mulher durona e resistente, pra eu desabar é porque a coisa tá muito feia. Fiz vários exames, nada de errado comigo. Dores horrorosas mesmo estando saudável. Minhas cólicas incapacitantes só melhoraram depois da pílula (hoje a dor é leve, mesmo sem tomar pílula, porque parece que a idade faz diferença nisso). Então eu acho que a gente pode criticar os excessos, mas os remédios são muito úteis. Ficar pregando essa coisa super naturalista é atraso. Eu não quero suportar a dor, quero é uma Neosaldina, porra!

E, bom, a diferença, né? Porque tem que ser levada em conta. Eu tô aí, fazendo um esforço pra entender mais sobre feminismo. E lembrei sobre o debate sobre se vale ou não a pena menstruar. De como eu fico dividida. Porque, por um lado, acho realmente assustador querer suprimir tudo o que parece desagradável. Tem o medo da intolerância: se a possibilidade de não menstruar se generaliza, temo uma menor tolerância ao sofrimento de quem, legitimamente, escolhe continuar menstruando. Por outro lado, que semana de merda eu tive. A natureza tá me devendo uma, onde eu cobro?

domingo, 22 de agosto de 2010

Do pesar e da indignação

Daí na sexta-feira, tarde da noite, eu entrei na internet e vi que a esposa do Dado Dolabella entrou com uma medida cautelar pro cara sair de casa, alegando que estava apanhando dele. E fiquei muito triste por ela. Pensei que tem uma galera que vai julgar, porque quando ela o conheceu já era notório que ele tinha batido na Luana Piovani. Que ela deveria saber, que foi burra de ter escolhido ficar com um cara assim, etc, etc. Mas não é assim que a banda toca. O cara pode tê-la convencido que o lance com a Luana foi um mal-entendido. Afinal, como a Luana é grandona, namoradeira e arrogante, ela não se encaixa no perfil da vítima coitadinha no imaginário coletivo. Por isso foi tão importante ela ter denunciado, pra todo mundo ter certeza de que mesmo mulheres ricas e independentes podem sofrer abusos.E a condenação do Dado pelo caso da Luana pode ter dado forças à esposa pra finalmente dar um basta.

Milhares de mulheres apanham dos seus companheiros todos os dias. Mulheres das mais variadas idades, classe sociais, níveis de escolariade. Nem posso imaginar a força necessária pra dar conseguir virara mesa e superar um drama desses num mundo machista como o nosso. Imagino a vergonha do (suposto) fracasso. A primeira vez que o cara bate. A esposa do Dado acreditou no cara, achou que a história dela ia ser diferente, e um dia ela levou o primeiro tapa. Aquele que mostrou que ele não era digno de sua confiança, que ela tinha caído numa armadilha. Eu escrevo isso e me dói, me dá vontade de ir correndo dar um abraço nessa moça, em toda mulher que passe por algo parecido.

Comentando com amigos num bar ontem, uma das presentes contou que isso já aconteceu com ela, de apanhar do companheiro e ter medo de ir embora por conta das ameaças. Que, pra resolver, mudou de emprego e de bairro. Mas que a avó dela não teva a mesma sorte. Essa avó, depois de apanhar por 18 anos de um companheiro - que a certa altura já era ex, mas invadia a casa dela com frequencia para agredi-la - depois de registar inúmeros boletins de ocorrência sem nenhum efeito, um dia, aos 62 anos de idade, matou o infeliz. Ficou 1 ano presa e conseguiu ser absolvida por legítima defesa. Imaginam a merda? Ir pra cadeia porque a incompetência do Estado fez com que ela se transformasse de vítima em ré.

Todo mundo conhece uma história dessas. A Mari Biddle postou essa aqui outro dia. E sabe, as pessoas muitas vezes relacionam isso ao alcoolismo. E o alcoolismo é parte da questão, claro, mas tá cheio que caras que batem na mulher de cara limpa, e caras que enchem a cara e não batem em ninguém. O vizinho dos meus pais é alcólatra. A gente ouvia quando ele chegava em casa bêbado e quebrava os móveis da casa. Ele e a mulher gritavam um com o outro, mas ele não batia nela. Dizia coisas horríveis, ela respondia, a gente fica tenso ouvindo, mas não batia. Não tô dizendo que agressão física é a única forma possível de violência, mas a gente nunca sentiu que a vida dela estava em risco. O cara hoje parou de beber e parece que eles vivem em relativa harmonia. Minha mãe tem uma amiga cujo o marido chegava bêbado em casa com flores roubadas do quintal dos vizinhos e passava o resto da noite chorando, envergonhado do vício. Os filhos de saco cheio já, falavam pra mãe largar o pai, que ele era um pinguço sem salvação, mas ela continuou, o cara entrou no AA, e hoje eles vivem bem. Quer dizer, quando o problema é só o álcool, acho até que pode haver, depois de muita luta, um final feliz independente da separação. Mas não consigo ver final feliz ao lado de um agressor. Na minha cabeça, "ele parou de beber, e eles viveram bem depois disso" é algo possível. Mas "ele parou de espancá-la e ficou tudo bem", não é. Porque eu acho que a violência doméstica não tem nada de inconsciente. Não dá pra colocar a culpa na cachaça e condenar a mulher que casou com o cachaceiro. Não dá pra colocar a culpa na mulher nunca, aliás.

Então, toda a minha solidariedade vai pra esposa do Dado, independente dela ter acreditado nele, dela provavelmente não ter se solidarizado com a violência sofrida pela Luana Piovani. Nada disso minimiza a dor da agressão. Ela não apanhou porque acreditou no marido: apanhou porque o marido é violento. A violência não acaba se "as mulheres escolherem melhor seus companheiros", como tem gente que gosta de dizer por aí. A violência para quando o agressor para de agredir.


Update: depois de publicar este post, vi que a Vanessa publicou esse, sobre o mesmo tema. E me lembrei que sexta-feira completou 10 anos que o Pimenta Neves matou a Sandra Gomide e o cara continua aí impune. E o pai dela falou da dor de sentir que vai morrer sem ver o assassino da filha cumprir pena. Nossa sexta-feira foi, simbolicamente, um dia especialmente triste.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A quem interessar possa

Então. É polêmico esse negócio, que eu sei. Mas eu vou comprar a Playboy da Cléo Pires porque eu acho que deve estar linda.

Não tenho nada contra a idéia de uma mulher posar nua. Nada contra imagens de corpos nus, nem mesmo nada contra a pornografia. Eu sei que a pornografia, por vezes, reproduz discursos machistas. Mas eu não acho que ela, em si, seja machista. A pornografia é a exposição explícita de sexualidade. Isso, isoladamente, não é machista, ao meu ver. Volto a dizer que, obviamente, tem representações pra todos os gostos, e muitos deles são muito machistas. Talvez a maioria, até. Mas eu não desqualificaria o resto nem por conta desta (suposta) maioria. A Beatriz Preciado conta em seu livro que houve, acho que no Canadá, uma articulação do movimento feminista pra censurar publicações pornográficas. E a primeira a ser censurada pela lei foi uma revista pornográfica lésbica. Quer dizer, é feita pra agradar a sexualidade feminina, mas não pode? Tremendo tiro no pé, na minha opinião, tal como o fechamento dos cares de strip na Islândia, como a Lu contou. Eu acho realmente temerário quando o discurso feminista coincide com o religioso. Agora, eu não tenho nada contra, mas não gosto do sexo explícito. Sei lá, aversão estética. Estética, e não moral. Acho cafona. Sério, acho cafona. Já erotismo eu acho lindo. Tipo, fotos bem produzidas, bons fotógrafos e tal. E a revista da Cléo parece que está assim.

Mas eu continuo me justificando aqui porque eu problematizo a questão, claro. Tem um lance, que eu acho que flerta com o abuso, da celebridade dizer que foi difícil, que teve que beber pra relaxar. E daí eu acho muito trash, porque parece mesmo o fetiche da humilhação, usar o poder da grana pra submeter uma mulher em escala macro. Tipo, você tá com vergonha, mas abaixa aí a calcinha que eu tô pagando. E, lógico, acho horrível essa idéia. Entendo claramente que, desse jeito, é sim muito machista. Mas a fotografada deste mês disse que A-DO-ROU posar. Que se descobriu exibicionista. Que teve a maior dificuldade de escolher as fotos da revista porque, por ela, publicava todas, achou tudo o máximo. Em outra entrevista li que a vó deu apoio, dizendo que na época dela levava puxão de orelha da professora porque subia a saia e mostrava a canela, então o fato de uma mulher poder posar nua é algo a ser celebrado. E essa discurso só me deu mais vontade de ver o resultado, porque tudo parece feito com muito prazer. Há uma troca clara aí, não uma submissão: o prazer dela em ser vista, e o do público em ver. E pra mim, quando há essa troca, há o livre exercício da autonomia. Não vejo machismo mesmo.

Daí alguém me diz que o problema da Playboy é que dá a entender que só aquele tipo de corpo é desejável. A questão da falta da representatividade da diferença. Que é real, claro, mas não é exclusiva da Playboy. A grande mídia, de maneira geral, não prima pela diversidade mesmo. Por sorte, temos a internet como espaço pra circular outros modelos. Eu gosto muito desse tumblr: (cuidado ao abrir). Não só porque nele eu me sinto bem representada (eu sou do tamanho das fotografadas ;-)), mas porque as fotos são mesmo muito bacanas. Para meu gosto, claro. E tem o que a Aline apresentou, o adipostivity. Quer dizer a internet dá esse poder, dá gente ter acesso a outras coisas. Ok, fica uma coisa meio underground. O mainstream é a Playboy mesmo. Mas não é porque ela é o mainstream que aquela representação não é legítima. Eu me acho linda (é, modéstia passa longe aqui). E acho a Cléo linda. E, claro, não é culpa dela se a Playboy quer mulheres do tamanho dela, mas não do meu.

Mas aí tem a questão do olhar objetificador. E eu não acho que achar um corpo sexualmente atraente seja desconsiderar automaticamente o sujeito que ele carrega. A sexualidade faz parte da nossa vida, e a atração física faz parte da sexualidade. Eu acho muitos corpos por aí altamente atraentes. Olha passar, suspiro e, quando faço isso, não estou preocupada com a pessoa que mora naquele corpo. O que não signifia, em absoluto que, se tiver que abordá-la, por qualquer motivo, vou tratá-la como um objeto. Mas, se estou olhando de longe, é só o corpo que me interessa, ué. A mesma coisa se o olhar se voltar pra mim. Sim, eu sou sexualmente atraente. Sim, alguém pode me olhar e só ver um decote, ou uma bunda grande marcando o vestido. E aí? É desrespeito? Quando a gente olha, só vê um corpo, não vê um discurso. E tudo bem. Se, porque eu estou com um decote alguém achar que essa é a senha pra me desrespeitar, o problema é do machista que fez isso, não do meu decote. Eu sei que o mundo é escroto. Que o pessoal acha linda a mulher posando na revista, mas não votaria nela. Ou você é um corpo, ou tem um discurso. Não pode as duas coisas. Essa separação corpo-intelecto pra mim parece herança religiosa do modelo corpo-alma: há que negar um para valorizar o outro. E as pessoas não se dão conta, mas é o mesmíssimo lance da Geyse ou do Taleban: que, pra garantir respeito, há partes do corpo que a mulher não deve mostrar. Eu exijo tudo: o direito de se mostrar e o respeito incondicional. Pra mim, não há meio-termo possível, não há condicional aceitável.

E aí tem o outro discurso que diz que olha, tudo bem, mas quando a Cléo, que é atriz filha de atriz, posa nua, ela vai ser respeitada, mas reforça o machismo de quem tá lá olhando. Ela pode, mas a outra, que não tem o mesmo status, paga o pato. Vamos lá: eu não tenho nada contra dançarina de funk. Nada contra a Mulher Melancia. Dizer que essa mulherada que ganha dinheiro seminua contribui para a idéia que há mulheres que só servem pra isso é repetir o discurso machista com a pretensão de combatê-lo. Seguinte: eu estudei literatura. No meu trabalho, não uso nada do que estudei. Meu trabalho exige muito menos capacidade intelectual do que a que eu tenho (de novo, modéstia aqui tirou férias). Tem gente que acha mesmo que se a pessoa está ali na base, assistente de algo, é porque não tem mesmo potencial pra ser chefe e tals. E eu já tive chefes sem um pingo de cultura: o cara era bom no que ele fazia e só. Por que eu tô nesse trabalho? Porque paga minhas contas. Eu não sei nada sobre ninguém que tá ali posando nua. Nem eu, nem ninguém que se coloca numa posição de julgar. A pessoa pode estar numa condição análoga à minha: usando apenas parte dos recursos que tem pra ganhar dinheiro num mundo em que não necessariamente o mais culto é o mais bem pago, mas todos precisam sobreviver. A diferença é que ser assistente em multinacional é algo que tem algum status no meio onde eu circulo - ser dançarina de funk ou axé, não.

Não tenho essa cegueira de achar que a minha escala de valores é a única válida. E não tenho a pretensão de achar que todo mundo que é esclarecido vai chegar à mesma conclusão que eu sobre algo. Não, né? O mundo é diverso, os pontos de vista também, claro. E eu acho as dançarinas de funk muito cafonas, na verdade. Não, eu não toparia fazer o que faz a Mulher Melancia porque tenho aversão a essa estética funkeira. Mas, como no caso da pornografia, o problema, pra mim, é de gosto mesmo. E o meu gosto pessoal não tem esse poder de desligitimizar nada.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

A ideologia e o pragmatismo

Comentário atrasado, mas parece que o Plínio arrasou no debate, né? Assisti só um pouquinho, porque tinha esquecido completamente e tava vendo o futebol. E vi lá a experiência e segurança do Plínio. Parece que ele fez sucesso no twitter depois, trending topics brasil e tal. E criaram lá os #plínioarrudafacts, pra tirar um sarro com o quanto ele é velhinho. Aí rolava uns lances de que ele tem experiência com portos, porque projetou a Arca de Noé, e experiência legislativa, porque tava na comissão que redigiu os 10 mandamentos. Acho que galerinha mais nova nem sabe que o que mais impressiona na experiência do Plínio é um fato bem real: o Ato Institucional nº 1, de 64, cassava os direitos políticos dele - e de outros contemporâneos, claro.

Tenho o maior respeito pelo Plínio. Fui lá fuçar o twitter dele. Achei especialmente sensível por ele, católico praticante, ter muito clara a divisão entre o estado e a fé. Vi lá ele comentando que duas pessoas do mesmo sexo compartilhando a vida constituem uma parceria civil que deveria ser reconhecida pela lei. E eu já tive a oportunidade de conversar com gente muito próxima a ele. Trata-se de um senhor bem conservador quanto à sexualidade dentro de casa: se incomodava com os filhos levarem namoradas para o quarto. Não estamos falando de um libertário, portanto, mas de um senhor de 80 anos que vai à missa aos domingos. O que não o impede de respeitar estilos de vida e convicções diferentes. Acho lindo, e tenho pra mim que o mundo seria um lugar muito mais agradável se houvesse mais gente assim por aí.

O Plínio aproveitou o debate pra marcar suas posições de maneira muito firme, com críticas ácidas a todos os presentes. Sua postura só me faz ter mais certeza de que a oposição séria no Brasil acabou quando o PT virou vidraça, digo, governo. Quer dizer, há oposição séria, como faz o próprio Plínio, mas ela ainda é muito pequena. Eu torço muito pra essa oposição crescer, criar corpo, porque o que não falta é coisa pra se criticar no governo Lula. E crítica de verdade, não discurso preconceituoso. Alguém aí ainda agüenta ouvir gente esperneando pra dizer que o Lula é analfabeto? Cara, que preguiça.

Mas nas considerações finais o Plínio disse que ele representava a divergência, e seus oponentes, a convergência. E puxa, é legal no discurso, mas não é assim que a banda toca. Não dá pra achar que, sendo eleito num cargo executivo, o cara (ou a cara) vai fazer o que quiser ali, porque não vai. Há um legislativo a ser respeitado. E um legislativo cuja importância as pessoas ainda não entederam, então vota-se no Lula pra presidente e num coronel do DEM pra deputado federal e tudo bem. Não sei se eu já disse aqui, mas acho um absurdo tentarem enfiar na nossa cabeça inequações com logaritmos e sairmos da escola sem ter claro pra que serve um senador.

Esta fala do Plínio me fez lembrar de um filme que assisti numa das aulas da pós, e recomendo muito. É a cinebiografia do Celso Furtado, chamada "Um Longo Amanhecer". O Celso Furtado, se alguém por acaso não sabe, foi um grande economista, um homem realmente comprometido com o país. Destacou-se tanto como acadêmico, quanto como político. E há neste filme um depoimento da Maria da Conceição Tavares que me marcou. Ela dizia que é muito diferente o mundo da academia, teórico, da prática política. Que um acadêmico sério pode ser inflexível, mas um bom político jamais. Pra fazer política, é preciso saber ceder, negociar sem abrir mão do essencial. E o Celso Furtado sabia fazer isso muito bem, mas que ela, segundo seu próprio ponto de vista, não. Então, o lugar dela era o da crítica acadêmica. E fazer essa crítica não significa desqualificar o trabalho do outro, pelo contrário - a boa crítica pode enriquecer.

Vejo o Plínio desempenhando um papel importantíssimo: o de criticar. Queria mais forças políticas de esquerda fazendo críticas ao governo, críticas que reverberassem. E por hora, por pragmatismo, eu fico com a continuidade, por que se não está tudo tão lindo quando querem nos fazer crer, está muito melhor que 8 anos trás. Disso eu não tenho dúvida.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Leituras feministas - Le conflit

A história é assim: eu descobri o blog da Amanda, vendo, não sei onde, um link para este post. E, puxa, além de tudo a Amanda mora na França, então, rolou identificação. Este post dela fala do livro polêmico da não menos polêmica Elisabeth Badinter, "Le conflit - la femme et la mère" (O conflito - a mulher e a mãe). Mandei o link pra minha amiga Ma que mora na França, tem um filho que acabou de completar um ano e havia me confessado que a maternidade era muito mais extenuante do que ela tinha previsto. Minha amiga gostou do debate e resolveu me dar o livro de presente de aniversário. Consegui lê-lo naqueles dias de repouso pós-cirúrgico. A Amanda fez dois posts sobre o tema (outro link aqui), e eu não queria repeti-los, porque acho que debate lá foi bem produtivo, com muitos comentários, e a gente não ganha nada redundando. Mas, como ela mesma colocou, o livro rende muitas discussões, então vou tentar abordar outros aspectos. Vale antes dizer que Badinter parece ser daquelas pessoas que tem gosto pela polêmica, com as quais é impossível a gente com concordar em alguns momentos, mas cujas provocações são interessantíssimas.

Bom, uma questão muito abordada por ela é a da amamentação. De que existe uma pressão enorme para que as mães amamentem, ainda que isso não seja de sua vontade. Taí a Gisele Bündchen que não me deixar mentir. Tô com preguiça de buscar o link, mas a nossa super-super, linda e loira, disse essa semana que deveria haver uma lei que obrigasse as mães a amamentarem seus filhos por 6 meses, no mínimo. Parece que ela se retratou e disse que não queria julgar ninguém. Cê jura, Gisele? Imagina se quisesse, né? Mas então, minha amiga teve seu filho na França e não só não sofreu pressão para amamentar como não teve apoio para fazê-lo. As enfermeiras da maternidade não a ajudaram, ela teve muita dificuldade no começo, o que provavelmente fez com que seu leite diminuísse. E ela se sentiu muito mal por isso. Não só por ter o seu direito desrespeitado, mas por não conseguir fazer o que acreditava ser o melhor pro seu filho. Pra piorar, seu pequeno era intolerante à diversas marcas de leite industrializado. Foram meses muito duros pra ela, e boa parte ela credita a essa diferença cultural. Imagino que aqui a coisa deva ser muito diferente. Não no sentido de orientação e preparo das enfermeiras, mas na cultura que preza a amamentação como obrigatória. O que eu acho disso tudo? Que amamentar deveria ser um direito, não um dever. Como tudo na vida, a gente deveria ter todas as informações disponíveis pra tomar a melhor decisão - e essa decisão é sempre personalizada. Uma coisa que eu acho que a Badinter manda muito bem é em ressaltar a desonestidade intelectual em alguns argumentos pró-amamentação, tipo comparar dados de mortalidade infantil incluindo países paupérrimos e desenvolvidos no mesmo balaio. Por que a qualidade da água, do leite e as condições gerais de higiene são completamente diferentes na França e no Gabão, né?

Minha mãe não pode me amamentar porque quase morreu quando eu nasci. Na época, os chamados leites de substituição eram caríssimos. Devo ter tomado por pouco tempo e logo depois migrado para o leite B de saquinho. E olha só, fui uma criança bem saudável. Segundo minha mãe, meu irmão caçula "não queria mais o peito" depois dos 4 meses. Sei lá porque. Tá aí também. Então, né? Menos. Eu não concordo com o discurso da Badinter que exalta a mamadeira como uma forma de igualdade entre o sexos, porque eu não acho necessário desqualificar qualquer processo biológico para defender a igualdade de direitos, acho até um argumento muito contraproducente. Mas não cabe a ninguém ficar julgando uma mulher por não amamentar, sejam quais forem os seus motivos (né, Gisele?). Porque se a amamentação é importante, ao mesmo tempo está longe de ser imprescindível.

Mas uma outra polêmica da autora, e que eu gostei porque permite filosofar um monte sobre o corpo feminino como campo de disputas políticas, é sobre a gravidez. Nos anos 70, não haviam pesquisas que ligassem o fumo e álcool a problemas com os bebês. Minha sogra é hardcore e fumou nas 3 gestações. E bebeu. Whisky, pra ser mais exata. Estão os três moços filhos dela muito bonitos e saudáveis, obrigada. A louca aqui tá dizendo que todo mundo deve ignorar as pesquisas e fumar e beber loucamente? Não, claro que não. Mas outro dia vi na internet uma foto da atriz Juliana Paes (que pra quem não sabe, está grávida) numa mesa de restaurante esticando o braço pra dar uma bicada no chopp da irmã. E a legenda não deixava barato: não crucificou a moça, mas deu lá um puxãozinho de orelha. Percebem? Se você engravidou, todas as suas vontades ficam condicionadas ao bem supremo do bebê, senão você é uma mãe execrável. Não sou mãe, e imagino que se eu for um dia, vou querer o melhor para o meu filho, lógico. Mas isso significa que se eu tomar uma tacinha de espumante no Reveillón estou comentendo um crime? A OMS recomenda a amamentação até os 2 anos de idade. E também não pode beber enquanto amamenta. 3 anos sem cachaça. Mas que boa mãe quer cachaçar, né? Minhas concunhadas são mães excelentes, mas lembro muito bem de uma delas amamentando a pequena e dizendo "ô tempo, passa logo, porque tô doida por uma gelada!". Não gente, ela não amamentou dois anos. Passada a licença, a mãe voltou a trabalhar, e a pequena foi pra um berçário o dia todo e passou a tomar mamadeira. (Digressão: antes de ver esse caso de perto, eu achava uma tristeza os bebês irem para o berçário antes de completarem 1 ano. Hoje acho que deve ser uma preocupação pra mãe achar um lugar legal, mas se achar, é excelente. Vocês não imaginam como essa menina - que tem 2 anos e meio agora - é feliz, independente e esperta.)

Lá no post da Amanda tem uma mulher que colocou um comentário (na verdade, vários) nessa linha de que é por aí, o bebê em primeiro lugar, escolheu então tem que ser assim, sem nenhuma margem para discussão. E termina com o clássico carioquês (acho que só no Rio falam assim, né?): "não sabe brincar, não desce pro play". E, advinhem? Mais e mais mulheres no mundo escolhem não descer pro play. A teoria do livro é que, como as francesas "brincam" à sua maneira, deixam de amamentar, dão comida industrializada, voltam ao trabalho pouco tempo depois, a imensa maioria delas é ou será mãe. Muitas de mais de 1 criança. Enquanto isso, estima-se que 30% das alemãs não terão filhos. Ok, a raça humana não está correndo risco de extinção, mas eu aposto que o governo alemão se preocupa muito com esta estatística. E apesar de não terem lá a melhor fama do mundo, não me consta que os franceses sejam todos uns doentes, infelizes e sociopatas. Então, essas "mães medíocres", pra usar a expressão da autora, devem ter cumprido suas tarefas direitinho.

Enfim, o livro não é contra os pobres bebezinhos. E, caso alguém desconfie do contrário, eu também não sou. Mas é fundamental que as mães não sejam vistas como egoístas se não estão se portando segundo um ideal social. Aliás, é importante desmontar esse ideal mesmo, porque ele só gera frustrações. Os bebês são seres humanos imperfeitos, filhos de mulheres imperfeitas, nascidos num mundo imperfeito. Se nada nessa relação é perfeita, porque o ônus todo tem que ficar com a mulher, sempre? Porque tudo nela tem que ser renúncia e resignação? Ok, as crianças não pediram pra vir ao mundo e não podem se manifestar. Mas eu tenho certeza que, se pudessem, muitos se horrorizariam com maneira como a sociedade os usa como justificativa pra oprimir suas mamães.

PS, de madrugada: vocês não morrem de vergonha quando, depois do post revisado umas 3 vezes e publicado, vocês encontram vários erros? Muitos deles? Alguns grotescos? Aff!

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Diversas

Estou com vontade de fazer outra tatuagem. A minha completa 10 anos ano que vem. E daí me dei conta de que eu não posso mesmo criticar quem faz plásticas. Tatuagem dói, é caro e não serve pra nada. Alguém pode argumentar que não dá pra comparar, porque a plástica exige internação no hospital, mais riscos, tem o lance machista de exigir corpo perfeito das mulheres e até que poder fazer tatuagem é uma conquista recente nossa. Tudo isso faz sentido, mas o fato é que, racionalmente falando, tanto colocar peito quanto tatuar as costas são coisas que não trazem nenhum benefício senão o estético. E do mesmo jeito que não quero que ninguém dê palpite nos meus rabisco, não vou dar nas turbinadas alheias. Só acho, como já disse aqui, que essa deveria ser uma decisão menos mediada pela expectativa da aprovação alheia.

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Antes de entrar no trem, comprei uma pipoquinha de uma carrinho enfrente à estação. Tinha bacon na danada. Deve ser muito difícil ser vegetariano num mundo em que nem as pipoquinhas são 100% vegetais.

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A cirurgia me deu uma desculpa legítima para não ir à academia, apesar de estar pagando. De quebra, minha colega de malhação acha que ser solidária a minha licença médica também é uma desculpa legítima para faltar às aulas. Né, gata?

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Não vou ficar aqui falando de novela, mas eu tenho que dizer que eu sou team Melina. Porque entre a moça que usa um cabelinho à la Louise Brooks e uma personagem interpretada pela Chatolina Dieckman que resolve trocar de namorado só porque deu uma voltinha de stock car, se casa com o ricaço em 2 semanas, se arrepende, e quer voltar para o Raj (o que foi trocado), pra quem eu poderia torcer? Ok, o fato é que os personagens dessa novela são chatos demais em seus dramas, e não me sentaria num bar com ninguém ali. Nem com a mocinha do cabelo Chanel. Mas eu sempre vou torcer pela outsider cool, nunca pela namoradinha. Por que todas as mocinhas são chatinhas? Por que nenhuma delas tem sal? Gente, entre Lara Croft e a Rachel, qual a dúvida? Lara Croft, claro! Conseguem imaginar a Jennifer Aniston interpretando um papel que inicialmente tinha sido escrito para o Tom Cruise? Não, né? Só que os caras costumam gostar das mocinhas-pra-casar, não das porra-loucas outsiders. Brad Pitt tem meu eterno respeito por ter escolhido a fodona-tatuada com o menino do Camboja a tira-colo.

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Falando em novela, a Mariana Ximenes deve apanhar daqui a pouco, viu? Vigarista e já deu pra 3, incluindo o Cauã. Questão de tempo, que a gente sabe como funciona, né? E eu tenho que dizer que, apesar das porradas inevitáveis, meu sonho na vida era ser vilã de novela. Teve uma em que a Alessandra Negrini pegou o Anthony, o Fábio Assunção, o Bruno Gagliasso e o Wagner Moura. Imagina você chegar de manhã no trabalho e sua "tarefa" ser alisar o peito do Marcelo Anthony? Sendo bem paga pra isso! Marido vai me desculpar, mas se este não é o melhor emprego do mundo, não sei qual é. Pronto, olha que fácil! Já decidi o que eu quero ser na vida! ;-)

domingo, 1 de agosto de 2010

Escolhas

Pois é. A vida é feita delas. Quando a gente é livre, pode e deve fazê-las, mas tem que arcar com as consequências delas. E há pessoas que nem dão conta de serem livres justamente por isso: porque gostam que poder jogar em ombros alheios suas frustrações.
Considerando que vivemos numa sociedade machista, que minha mãe tem lá seus dogmas religiosos e tal, eu sou bem livre, até. E leve, no geral. Definitivamente há escolhas das quais eu me arrependo, mas sem nenhum peso: toda escolha é uma renúncia, e tento não focar nas ausências, mas nas presenças.
Estudei Letras. Amei o curso com todas as forças. Agora, na pós, lembrei que algum dia eu pensei em prestar Economia, mas não tive coragem de sair de São Paulo pra estudar na Unicamp (o curso da USP é mais neoliberal, e eu definitivamente não queria isso pra mim). Meu primeiro vestibular foi pra Jornalismo, eu passei numa particular, não passei na USP e não quis pagar. Passei pra Letras no ano seguinte, comecei a faculdade um pouquinho mais tarde (já com 20 anos) e gostei.
Eu trabalhava em multinacional durante o dia, e vivia divida entre dois universos. Dividida modo de dizer: eu amava o acadêmico, rejeitava o corporativo, mas não queria abrir mão da grana. E tive lá minhas recompensas. Quantas pessoas você conhece que podem pagar 1 mês de curso na Espanha (mais passagem, estadadias e passeios) com as próprias economias aos 21 anos de idade? Pois é, eu pude.
Só que eu sempre tive (e continuo tendo, aliás) uma insegurança intelectual enorme. Eu até sonhei durante algum tempo com a carreira acadêmica, mas achava que o mundo corporativo é que era meu lugar. No mundo corporativo a gente não precisa ser super inteligente, basta ser um pouco capaz e minimamente espertinha. E isso eu sou. E eu achava que esta história de professores que "apadrinham" alunos só acontecia com gente brilhante, ou quem batalhasse muito para ser reconhecido. Mas um professor muito bacana gostou de mim. A ponto de me incentivar muito. A ponto de me convidar para um grupo de estudos com gente da pós. E, puxa, isso aumenta as inseguranças de quem é insegura, viu? Porque a gente surta com o medo de não corresponder.
Num sábado qualquer, ainda na época da faculdade, encontrei esse professor na fila do cinema. Foi como ver uma assombração. Eu lá, sem graça, assustada, e o cara puxou papo e disse: "Iara, quando você vai explorar seu potencial para os estudos literários?". Ok, pergunta inocente. Mas feita pausadamente, numa voz meio soturna, sabem? Juro, virou um fantasma. Meu potencial me perseguindo.
Ainda assim, eu achei que quando voltasse de França, ia começar meu mestrado em literatura. Quando viajei, pensei que talvez até ficasse para fazer na França mesmo. Mas eu voltei e procurei emprego de novo como secretária (e acho que meu pai lamentou por isso). Só que eu tive que ir a USP pegar algum documento logo quando cheguei (nem lembro mais o que). E vi esse professor saindo da biblioteca. Vindo em minha direção. Ele não me viu, então eu me escondi. Tive vergonha e dizer: "tudo bom? então, eu não vou explorar meu potencial para os estudos literários, viu? resolvi voltar a ser secretária porque, apesar de ser um trabalhinho bem cretininho, paga melhor do que a 'pochete-de-estudos' da 'c-n-pouquinho'".
Ok, dito assim, parece bem "mimimi" e covarde, e não é esse o ponto. Se eu tivesse certeza que era a literatura, eu tava lá. Se hoje eu chegasse a essa conclusão, recalculava a rota e voltava pra lá. Se eu decidir amanhã, faço isso, acreditem. Eu posso fazer isso, mas a dificuldade é, justamente, não saber o que eu quero ser quando crescer apesar de ter 30 anos, 1 metro e 67 e quase 80 quilos. Fico em dúvida ser astronauta, policial ou jogadora de futebol. A verdade é que eu gosto de muita coisa, o que no fundo é bom. Ou não. Sei lá.
Mas porque tudo isso agora, então? É porque eu lembrei do Caio Fernando Abreu. E Caio Fernando Abreu me lembra este professor também, mas não só, pelo fato de serem os dois gaúchos. Mas principalmente porque este professor já orientou trabalhos sobre o CFA. Eu já coloquei aqui uma citação dele (do CFA, não do professor) inspiradora. Tive que procurar nos posts antigos pra ter certeza, achei em novembro.
Enfim. Eu continuo aqui. Sem "explorar o meu potencial para os estudos literários". Mas lendo, ainda assim.