terça-feira, 31 de agosto de 2010

Centenário \o/ e inquietações políticas

Então, 100 anos de Corinthians. E eu nem sei porque me tornei corintiana. Meu pai é sãopaulino, mas nunca foi muito empolgado com futebol. Acho que não tem ninguém próximo que justifique meu afeto. Lembranças mais antigas me remetem ao Sócrates. Devo ter ouvido algum comentário elogioso à Democracia Corintiana quando eu era bem pequena, e ficou a simpatia. Que virou amor. Não é nem paixão, é amor mesmo, daqueles que ocupa um lugar certo mesmo sem queimar. E lógico, casar com um palmeirense louco por futebol, viver a coisa da rivalidade dentro de casa todo dia, tornou tudo mais apimentado. Mas é assim independentemente do marido. Eu sei: não tem estádio, não tem Libertadores, e hexa e blábláblá. Não me venham com argumentos racionais. Não é assim que o amor funciona. Eu não deixei de amar quando viramos lavanderia de dinheiro da máfia russa, nem quando caímos. Lamentei muito, mas continuei amando e continuei fiel. E posso reconhecer que deve ser luxo ter galeria de títulos ou um presidente professor da Unicamp. Mas meu coração tem dono.

***

Então vem o lance do estádio. A Mary W postou aqui. E eu acho que ela tem razão em se indignar. É o seguinte: pra quem ainda não sabe, parece que o Lula, notório corintiano, pediu “uma força” pra Odebrecht pra sair esse estádio. Pedir uma força pode não ser crime, mas não existe almoço grátis, e o Lula deve saber disso. Então, se meter numa dessas assim, com sua sucessão quase garantida, é no mínimo temerário. O pior é que eu acredito muito que tenha sido assim. Não tenho esses preconceitos burgueses contra o Lula, mas tenho lá meu pé atrás. Acho que ele é um fanfarrão, e essa é o tipo de fanfarronice que é a cara dele. Então, dei uma broxada geral. Não queria nem o Lula nem o Corinthians envolvidos com isso. Fiquei com dupla vergonha alheia. E chego no trabalho e minha chefe, conservadora e palmeirense, diz que vão chamar o tal estádio de “Luiz Inácio Lula da Silva”. Argumento pra dizer que ela tá falando bobagem? Não tenho. Se acharem aí, me emprestem, por favor. E eu posso até zoar com marido, dizer que eu sou corintiana como o Lula, e ele palmeirense como o Serra, dizer que minha companhia é melhor, mas não é assim que a banda toca. Como eu disse acima, futebol é paixão – e política, pra mim pelo menos, é razão. Uma razão bem dura, aliás.

Meu consolo é que eu acho a Dilma muito diferente disso. Não se parece em nada com ela esse tipo de coisa. Então eu realmente acho que ela pode ser melhor do que o Lula em muitos aspectos. Que a eleição dele foi importante historicamente e tal eu não tenho dúvida. Mas pra mim, deu. Muita popularidade, muito poder, não sei aonde isso leva. Tem gente que vai chiar, dizer que torce pra ele voltar em 2014, como já ouvi por aí. Eu não. O governo Lula não é só o Lula, a gente tem que lembrar disso. A gente não precisa dele no poder pra garantir nada de bom do que foi feito - e nossa democracia só vai estar madura quando isso estiver claro. Ele tem qualidades inegáveis, mas não quero esse super líder populista. Não quero um mito. Tá bom assim, já.

Daí eu lembrei que uns dias atrás eu falei por telefone com meu melhor amigo, que tá envolvido com o PSOL. E foi muito legal a conversa. Marido tinha aberto um vinho, mas ficou pacientemente me olhando e esperando a ligação terminar pra conversarmos, porque ele sabia que eu ia vir com boas observações. E como a gente sabe que tem a Reinaldos Azevedos e Mainardis por aí, trabalha em multinacional com coleguinhas reaças, fica achando que é de esquerda. Mas meu amigo veio, me deu um safanão e me mostrou que eu, na verdade, tô na centro-esquerda. E eu tinha perdido isso de vista mesmo, sabem? E na conversa com ele surgiu uma série de pontos importantes. Que as pessoas estão comprando TV de plasma, mas não têm atendimento médico decente. Que se gasta mais com comida, comprando supérfluos, mas as pessoas estão ficando obesas e subnutridas ao mesmo tempo. Isso porque a gente nem falou do saneamento, esse horror. Enfim, uma série de críticas que precisam ser feitas, que precisam ser ouvidas. Mas meu amigo faz de um ponto de vista marxista com o qual meu discurso já não se afina. Além disso, devo admitir que tenho imensa preguiça de um partido pequeno e já rachado. Se não conseguem se entender entre os próprios quadros, como esperam administrar esse país tão grande? Mas ainda assim, tendo a votar no PSOL no legislativo, porque ando com sede de oposição bem fundamentada. Acho indispensável pra democracia essa oposição tomar corpo pra ontem, viu? Se até o Serra tá tentando convencer a gente que não é oposição, é porque tem um discurso único aí que não é bacana. Longe de ser ameaçador porque a imprensa trata de malhar bastante o governo. Mas que a falta de críticas construtivas é um problema, isso é.

***

No mais: TIMÃO-Ê-Ô, TIMÃO-Ê-Ô! \o/

5 comentários:

  1. Concordo com a parte política, o presidente não devia ter se metido nesse assunto.
    Por outro lado, sou são-paulina, mas fiquei muito feliz pelo curintia finalmente ter um estádio e mais ainda por ele ser na ZL. Se eu fosse política essa seria minha meta, desenvolver as periferias. Está mais que na hora da gente parar de espremer o centro e expandir as periferias, iria melhorar o trânsito (pra mim é absurdo alguém sair de S.Mateus pra trabalhar na Berrini, por exemplo) e de quebra redistribuir o desenvolvimento.

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  2. Iara,

    Ai, gosto tanto de conversar aqui. Vou entrando, sentando e paeando e acho bom.

    Bom, não sei, mas acho que perdi algum fio da meada no seu texto (sabe como é que é, sou meio lerdinha). Concordo com o lance do estádio; essa é a primeira vez que vejo algo sobre o assunto (gente, em que planeta eu vivo, ne?), ainda não estou por dentro da história, mas já li aqui o suficiente para concordar em um ponto: o Lula não tem nada que meter bedelho onde não deve e misturar as coisas. Mas discordo do tom que você deu à coisa, diminuindo drasticamente a importância dele no cenário da nossa política, ainda que você mencione suas “qualidades”. Posso até achar que “deu”, passa a bola, renovação e tal (relembrando aos distraídos, claro, que renovação não significa entregar o governo à uma oposição de cartas marcadas) mas o Lula não tem a popularidade que tem por acaso. Reduzir o que estamos vendo a populismo é desconsiderar os avanços sociais reais que o país vem recebendo, né não? Eu cá com meus botões também acho que a Dilma vai superá-lo em muitos aspectos - bom pro país que seja assim - vixe, preciso dizer isso lá no meu blog porque não foi isso que dei a entender no post sobre o Lula/Dilma. Mas há certo tom de desprezo quando você escreve que “a gente não precisa dele no poder para garantir nada de bom do que foi feito” que, penso eu, é muito injusto com o tipo de conduta social que o governo dele teve e do qual ele foi o maestro. Você deve estar aí pensando “ah, a Rita, toda apaixonada pelo Lula”, mas juro que estou fazendo um esforço bem grande para ser só justa. :-D E também não quero um mito, mas o governo Lula vai ficar na história como um marco no desenvolvimento social do país, não tenho dúvida disso e aí paciência, deixa o mito. Os números da mobilidade social bastam para isso. E isso não é ser populista, a meu ver, mas é direcionar o olhar para onde precisa ser direcionado. Tudo bem, o populismo no seu texto tá ligado ao lance do estádio e não quero passar a mão na cabeça de ninguém: tá errado usar prestígio político para manipular tomadas de decisão em outras áreas, ponto. Melhor eu me informar mais sobre o assunto. No mais, parabéns pelo aniversário do seu time!

    Rita

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  3. Eu vim aqui três vezes comentar e desisti pq não conseguia achar o tom. Mas aí vem a Rita com serenidade e lucidez e coloca as palavras na minha boca.

    Achei o seu post injusto com o Lula, pq as mudanças não aconteceram sem ele, mas com ele e por causa dele. E fica difícil imaginar que aconteceriam se ele não tivesse sido eleito em 2002. Mas não quero ficar no "Se" porque, se plantássemos um pé de "se", nasceria um pé de "quase".

    E acredito e espero que a Dilma supere o Lula porque além de ter o coração no lugar certo (no mesmo lugar que o Lula tem) ela tem outra característica importante que talvez falte ao Lula: ela tem muito foco (e é meio nerd, com um traço obsessivo).

    No mais, eu acho que a maryw tem uma paixão futebolítica que beira a religião e desconfio DEMAIS de todas as motivações do post dela. Sem contar que esse ar blasé de paulista e são paulino "não queremos copa no morumbi pq paulista não tolera uso do dinheiro público pra isso" quase beira o elitismo, o que na maryw é uma contradição. Veja a que ponto o futebol pode levar uma pessoa.

    Talvez a última parte do comment ficasse melhor se colocada na caixa de comentários de lá, mas vc linkou aqui, então...

    Beijocas.

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  4. Ashen,

    A parte de levar estrutura pra ZL é realmente o melhor da coisa. E eu concordo tanto com você sobre isso que é ridículo o cara atravessar a cidade. Imagina que, no lugar onde pretendem construir o estádio, fizessem um grande centro de negócios e tecnologia. A quantidade de empregos, o quanto atrairia de investimentos, o quanto mexeria com os transportes, enfim. Porque não tem transporte público que dê conta de tanta gente atravessando a cidade, as viagens tem que ser mais curtas.


    Rita e Dani,

    Então, agradeço muuuito pelo debate. Relendo o post, acho que realmente pode parecer que acho o Lula pouco importante, e eu não é verdade. Tinha que ser ele lá, naquele momento. É a eleição do Lula, da história dele, da militãncia operária, que marcam essa virada tão importante. E gosto muito da analogia da Rita com o maestro. É isso, claro. O maestro é fundamental. Mas a orquestra tá lá, né? Se o maestro for embora, eles não desaprendem a tocar, pra mim o ponto é esse. Então, minha resistência é uma construção política baseada no personalismo, que na minha opinião não seria madura democraticamente, não seria positiva para o país. Tô falando mesmo do daqui pra frente, não do passado (nem do presente, porque o Lula ainda é o presente e acho que tá certo). Então não pode ficar nessa dependência. Acho lindo mesmo que venha uma mulher agora.
    Quanto ao populismo, puxa, não acho mesmo que o governo tenha sido populista. Mas acho sim que o Lula às vezes "navega na onda" do seu super carisma. Ontem, nas comemorações pelo centenário, a coisa ficou clara. Houve um momento palanque eleitoral no evento do Corinthians que não tem nada a ver na minha opinião. Mas que só rolou porque é o Lula. E eu respeito esse apelo vindo do povo, mas me dou direito de criticar o Lula por navegar nele.

    Dani,

    Sobre a Mary W, acho realmente que alguns pontos dela são no maior estilo elitista, do "a gente não precisa disso" etc, etc, que combina bem com o estereótipo que a gente faz aqui do sãopaulino. Mas eu acho que essa crítica dela é fundamentada, sim, viu? Pra mim não seria suficiente pra deixar de votar no PT, porque eu tenho muito claro que a Dilma não é o Lula, e apesar de estar incomodada com a história, como eu disse aqui, ela não me surpreende. Mas concordo que Mary W coloca um "tempero" na coisa que é muito pessoal. Mas não invalida a crítica política deste caso, de jeito nenhum.

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  5. Iara e Dani,

    Posso morrer de adorar de conversar com vocês duas?

    Então tá.

    Bj,
    Rita

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