segunda-feira, 9 de agosto de 2010

A ideologia e o pragmatismo

Comentário atrasado, mas parece que o Plínio arrasou no debate, né? Assisti só um pouquinho, porque tinha esquecido completamente e tava vendo o futebol. E vi lá a experiência e segurança do Plínio. Parece que ele fez sucesso no twitter depois, trending topics brasil e tal. E criaram lá os #plínioarrudafacts, pra tirar um sarro com o quanto ele é velhinho. Aí rolava uns lances de que ele tem experiência com portos, porque projetou a Arca de Noé, e experiência legislativa, porque tava na comissão que redigiu os 10 mandamentos. Acho que galerinha mais nova nem sabe que o que mais impressiona na experiência do Plínio é um fato bem real: o Ato Institucional nº 1, de 64, cassava os direitos políticos dele - e de outros contemporâneos, claro.

Tenho o maior respeito pelo Plínio. Fui lá fuçar o twitter dele. Achei especialmente sensível por ele, católico praticante, ter muito clara a divisão entre o estado e a fé. Vi lá ele comentando que duas pessoas do mesmo sexo compartilhando a vida constituem uma parceria civil que deveria ser reconhecida pela lei. E eu já tive a oportunidade de conversar com gente muito próxima a ele. Trata-se de um senhor bem conservador quanto à sexualidade dentro de casa: se incomodava com os filhos levarem namoradas para o quarto. Não estamos falando de um libertário, portanto, mas de um senhor de 80 anos que vai à missa aos domingos. O que não o impede de respeitar estilos de vida e convicções diferentes. Acho lindo, e tenho pra mim que o mundo seria um lugar muito mais agradável se houvesse mais gente assim por aí.

O Plínio aproveitou o debate pra marcar suas posições de maneira muito firme, com críticas ácidas a todos os presentes. Sua postura só me faz ter mais certeza de que a oposição séria no Brasil acabou quando o PT virou vidraça, digo, governo. Quer dizer, há oposição séria, como faz o próprio Plínio, mas ela ainda é muito pequena. Eu torço muito pra essa oposição crescer, criar corpo, porque o que não falta é coisa pra se criticar no governo Lula. E crítica de verdade, não discurso preconceituoso. Alguém aí ainda agüenta ouvir gente esperneando pra dizer que o Lula é analfabeto? Cara, que preguiça.

Mas nas considerações finais o Plínio disse que ele representava a divergência, e seus oponentes, a convergência. E puxa, é legal no discurso, mas não é assim que a banda toca. Não dá pra achar que, sendo eleito num cargo executivo, o cara (ou a cara) vai fazer o que quiser ali, porque não vai. Há um legislativo a ser respeitado. E um legislativo cuja importância as pessoas ainda não entederam, então vota-se no Lula pra presidente e num coronel do DEM pra deputado federal e tudo bem. Não sei se eu já disse aqui, mas acho um absurdo tentarem enfiar na nossa cabeça inequações com logaritmos e sairmos da escola sem ter claro pra que serve um senador.

Esta fala do Plínio me fez lembrar de um filme que assisti numa das aulas da pós, e recomendo muito. É a cinebiografia do Celso Furtado, chamada "Um Longo Amanhecer". O Celso Furtado, se alguém por acaso não sabe, foi um grande economista, um homem realmente comprometido com o país. Destacou-se tanto como acadêmico, quanto como político. E há neste filme um depoimento da Maria da Conceição Tavares que me marcou. Ela dizia que é muito diferente o mundo da academia, teórico, da prática política. Que um acadêmico sério pode ser inflexível, mas um bom político jamais. Pra fazer política, é preciso saber ceder, negociar sem abrir mão do essencial. E o Celso Furtado sabia fazer isso muito bem, mas que ela, segundo seu próprio ponto de vista, não. Então, o lugar dela era o da crítica acadêmica. E fazer essa crítica não significa desqualificar o trabalho do outro, pelo contrário - a boa crítica pode enriquecer.

Vejo o Plínio desempenhando um papel importantíssimo: o de criticar. Queria mais forças políticas de esquerda fazendo críticas ao governo, críticas que reverberassem. E por hora, por pragmatismo, eu fico com a continuidade, por que se não está tudo tão lindo quando querem nos fazer crer, está muito melhor que 8 anos trás. Disso eu não tenho dúvida.

8 comentários:

  1. Uau. Concordo com cada letra, vírgula, ponto...

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  2. Oi, Iara.

    Ai, queria saber escrever assim. Pois é, lindo o Plínio e tal, mas sabemos que seeeee ele fosse eleito e não negociasse ou fizesse alianças, dificilmente conseguiria grandes avanços para o pais. Não quero que pensem que engulo todas as alianças do PT & cia, não engulo. Mas o mundo é mais espinhudo do que os bancos acadêmicos. Ah, mas hoje só consigo dizer que adorei a forma como a Dilma desbancou o casal Bonner no JN. Score!

    Beijos!
    Rita

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  3. Dani,

    Brigada! ;-)

    Rita,

    Elogia assim não que eu fico sem graça. Pois é. Eu também não concordo com muita coisa, claro, mesmo considerando que ceder é parte do processo. E não vi o JN. Vou ter procurar no youtube.

    Bjo!

    Bjo!

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  4. Ai, eu estava um pouco inclinada a votar no Plínio antes do debate, e queria a confirmação. Depois do debate, desisti da escolha.
    Não sei, mas pelo menos para mim, ele não agiu de uma forma séria. Não consigo confiar numa pessoa que muda o rumo de um debate para os outros candidatos. Isso para mim, soa como insegurança e falta de propostas. E é, para mim, ele não respondeu nenhuma pergunta perguntada. Só falou coisas que iria fazer -sem relações com as perguntas - e ofendeu gratuitamente os candidatos, mesmo que eles merecem, a postura dele como futuro candidato não deveria ser essa.

    Não sei, mas esse debate me deixou decepcionadíssima.

    ;)

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  5. Melina,

    Jura que você se decepcionou? Sei lá. Eu acho que a postura do Plínio tá de acordo com a de alguém que não está se candidatando pra vencer, mas pra fomentar um debate. E isso ele fez bem. Mas eu concordo que não pra pra imaginá-lo como governante com essa postura.

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  6. Poxa, amei seu texto. Uma colega minha me passou pelo Reader e assinou embaixo de tudo o que vc disse. E eu assino também. Eu conhecia a envergadura política do plínio de muito tempo atrás e sempre soube que ele é um cara coerente...

    parabéns pela sua análise. Falou tudo e eu assino embaixo.

    P.S.: Como matemático também sou contra ensinarem logaritmos na escola básica. Pros alunos é inútil, ainda mais quando tem tanta coisa boa que fica de fora...

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  7. Oi, Iara.
    Li seu texto no mesmo local que o poetamatematico, a amiga a que ele se refere é minha também.
    Faço minhas as suas palavras. Também sou muito solidário ao Plínio, por manter com tamanha paixão uma utopia tão acesa, e principalmente por chegar aos 80 anos com a coerência que tem. Embora pareça puro voluntarismo, essa é uma postura que eu sempre respeitei.
    Concordo contigo, e sobre isso sempre converso com o poetamatematico, de que eu torço para que oposição de esquerda se fortaleça, para que assim haja uma oposição coerente, republicana, livre do oportunismo eleitoral e do casuísmo que há muito tempo intoxicam a oposição PSDB/DEM.
    Eu apoio o governo Lula por entender que foi um governo muito positivo para o país em vários sentidos, mas tal como vc, também tenho críticas às contradições. Votarei na Dilma, pela continuidade com avanços, mas aqui no Rio, os meus votos para Senador, Dep.Federal e Governador serão do PSOL, para que essa oposição coerente, boicotada pela grande mídia, se fortaleça.
    Abraços.

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  8. Poeta,

    Obrigada pelo elogio! Acho que é meio ponto pacífico que o Plínio é um cara sério, né? E sobre o ensino de matemática, eu como formada em letras tenho muitas críticas também ao currículo da escola nessa área. Parece que a escola tem um tremendo interesse em ser desinteressante, né?

    Thiago,

    Minha posição é muito parecida com a sua. Tendo a votar no PSOL para o legislagitivo também, justamente porque confio neles como oposição crítica, que controla sem impedir a governabilidade. Abraço pra você também!

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