segunda-feira, 26 de julho de 2010

Tudo jóia?

Quinta-feira passada, ainda de férias (voltei a trabalhar hoje) resolvi dar uma volta. Acabei no Shopping Iguatemi. Pra quem nunca ouviu falar, ele foi o primeiro construído em São Paulo (então é provável que tenha sido o primeiro do país). Até outro dia, era o mais caro e elegante. Eu tenho uma certa relação afetiva com ele porque o meu primeiro emprego de verdade, mais de 10 anos atrás, era na região, e eu almoçava lá de vez em quando. Era engraçado, porque apesar da pompa, tem duas lojas bem populares na entrada. Aquela coisa, né? Se tem MacDonald's e C&A mesmo os funcionários mais modestos dos prédios ali por perto conseguem consumir alguma coisa lá dentro.
Só que este shopping fica numa avenida movimentada e servida por muitas linhas de ônibus. Apesar da elegância que pode ser opressiva para alguns, o prédio é acessível, geograficamente falando, pra qualquer pessoa. Por isso mesmo desconfio que ele perdeu o posto de bambambam: há um agora em que só se entra de carro. Deve ter uma entrada nos fundos pra funcionários, mas a coisa é bem hierarquizada mesmo. O estacionamento custa uns 30 reais a primeira hora. E fica num grande empreendimento com edifícios residenciais e comerciais também. A idéia é que você saia o mínimo possível, e só conviva com quem tem outra realidade quando estas pessoas estiverem te servindo, claro. Do tipo de coisa que me faz ter muita vergonha alheia por quem escolhe isso pra si, sabe? Colocam um muro enorme entre eles e o resto do mundo e se espantam com a violência depois. Eu sei, eu sei, outras cidades podem ter aberrações neste sentido também, mas às vezes parece que São Paulo é hour concours em facismo.
Mas, enfim, o Iguatemi não ficou popular por ser menos esnobe. Muitas grifes de alto luxo estão lá. Você acha caro um sapato de 200 reais? Lá tem de 2 mil ou mais. Mas o motivador deste post foi uma vitrine de joalheria. Olha só, eu sou super crítica a respeito da acumulação, acabei de assistir "Diamante de Sangue", mas eu acho jóias bonitas. Não como objeto de desejo, entendem? Acho bonito o trabalho de criação, o design mesmo. Nem olho desejando, pensando: "ó, um dia eu quero ter isso", porque não vou e não quero. Nada a ver comigo. Consigo excluir toda a ideologia por trás e achar bonito de ver, como quem vê uma obra num museu. Só.
Se mais alguém tem essa curiosidade, já deve ter reparado que os preços das coisas realmente sensacionais não são mostrados, mesmo que as peças estejam expostas na vitrine. Essa loja do Shopping Iguatemi tinha uns anéis com solitário de brilhante. Sabe daqueles de filme do mocinho que pede a mocinha em casamento e dá o engagement ring?. Então, tinha uns três assim lá. Os mais simples custavam 20 mil reais. O maior custava 200 mil. O preço tava lá, pra quem quisesse ver.
Eu fiquei muito triste depois de ver o preço deste anel. Bateu aquela coisa ingênua até de "tanta criança aí passando fome e madame colocando 200 paus no dedo". Depois fui mais longe nas reflexões e pensei que nada impede um cara de comprar um destes de presente pra uma mulher e tratá-la como lixo - embora de maneira nenhuma eu esteja estabelecendo alguma relação de causa e consequencia entre as duas coisas, que fique claro. Tem uma música do Skank, Os Ofendidos, que diz assim: "o mundo não me assusta/ o mundo só me insulta". No meu caso, as duas coisas, viu? Assusta muito e insulta mais ainda.

10 comentários:

  1. Post super maneiro. Goiania, de onde vim, é também uma cidade que adora explicitar a extratifificao social. Tipo assim, até festival de cinema e teatro, totalmente financiado e promovido por prefeita e/ ou estado, se realiza em lugares onde nao passa onibus algum, super inacessivel pra quem nao tem carro.

    Uma das coisa que mais me fascinou qd mudei pra Europa foi isso. Aqui, eu e meu marido vamos aos lugares onde os endinheirados vao, pq ma maioria dos lugares nao tem ostentacao. A desigualdade social aqui é bem menos visivel e em qq pub, shopping, clube, praca, vc encontra tanto staff do MC Donald quanto engenheiro presidente de multi nacional.

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  2. Identificação total: também gosto de olhar jóias pelo design! E ir ao Iguatemi sem comprar nada! Se bem que lá, por várias vezes, os seguranças da Tiffany vieram me perguntar o que queria enquanto olhava as vitrines, aquelas que ficam (ficavam?!) do lado de fora. Devo ter cara de pobre. Mas por que coloca vitrine do lado de fora, oras?!
    Quando o Villa Lobos abriu, de cara eu o elegi o shopping mais elitista de SP, já que pra chegar lá de outro jeito que não seja de carro é uma dureza! Mas agora tem o Cidade Jardim, parece que tem outros, vish, não lembro! Perto desses, o Iguatemi é super democrático, afinal, eu e você até podemos ir lá olhar jóias sem querer comprar nada.
    E os shoppings populares, voltados para a chamadas classes C e D?! Sempre praticamente dentro das estações de metrô, como o Santa Cruz e Tatuapé, sempre lotaaados também. No cinema, filmes dublados.
    SP proporciona um verdadeiro estudo de sociologia dos shoppings!!
    Saudades de Sampa. Ainda bem que tem seu blog para refrescar as lembranças!!
    Bjss!!

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  3. Iana, acompanho o blog a algum tempo, mas nunca tive pretensão de comentar por comentar. rs
    Bem, creio que o outro shopping do qual esteja falando é o Cidade Jardim, certo? A construtora deste veio à Salvador, onde resido, e está construindo um empreendimento bem semelhante ao que você descreveu no post. Condomínio de luxo fechado com shopping center de alto luxo dentro dos muros do empreedimento (há um frison enorme em torno do shopping pq, aparentemente, a Daslu, sonegadora fiscal, abrirá uma filia aqui. AH! O Fasano pode instalar uma filial da rede no empreendimento também)
    Enfim, comento isso pois Salvador (quiça a Bahia, já que os interiores querem o que tem na capital) copia muito do que vê em São Paulo. Querem tanto o estilo de vida paulista que os edifícios residenciais e comerciais são muito parecidos com os de SP. É triste ver isso, tanto como moradora/observadora quanto como aluna de arquietura... mas isso já vai entrar em outra discussão. rs

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  4. Ana Flávia,

    Eu também tinha essa sensação em Paris, sabe? Tudo bem, a gente sabe que quem é mais fácil mora afastado, na periferia. Mas os espaços públicos são frequentados por todos, né? Eu curtia muito isso.

    Aline,


    Falando do Villa Lobos, você me fez lembrar uma história. Uma vez fui lá e cismei em voltar de trem. A estação mais próxima fica a 1km, distância super caminhável. Mas é um trecho escuro na Marginal Pinheiros a noite, né? Fiquei tão assustada. Mas é que eu não consigo aceitar essa idéia de ser obrigada a pegar um táxi por falta de opção. Excludente demais isso! É, shoppings rendem muito assunto mesmo viu? A começar por serem uma aberração urbanística.

    Janaína,

    É triste ver que o copiado nunca são as boas idéias, mas o que há de mais excludente, né? Pura herança escravocrata, pobre bom é só o porteiro e a faxineira. Sobre a Daslu, dê uma olhada no blog "De chanel na laje", linkado aqui ao lado. A autora, que escreve sobre moda e comportamento de maneira muito inteligente e zero deslumbrada, tem um post ótimo sobre isso. Essa gente que sonega imposto e monta uma creche com 1% do valor pra posar de socialmente correta me dá nojo.
    Bacana que você faz arquitetura. Deve ter visto por aqui que eu estou fazendo um pós que trata também de urbanismo. É isso, no final das contas, né? Toda uma arquitetura para a exclusão. Deprimente. Ah! E comente sempre que quiser, viu? Faz tão bem ler comentário de gente tão bacana!

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  5. em JP os pobres e ricos tem que dividir o mesmo shopping, porque, de importante mesmo, soh existe um. os dois outros sao brincadeirinha de criança. entao eh engracado ver as madames de JP desfilando, como se fossem as figuras mais importantes da cidade, ao lado da galera que vai ao shopping com a roupa de banho pra ficar olhando vitrine (o shopping fica entre uma grande favela e uma praia).

    tenho horror a shopping por nao conseguir me identificar com nada ali. tudo sempre absurdamente caro. as pessoas se vestem como se fossem a um casamento. nao da pra mim. aqui em lyon, eu tenho que entrar no centro comercial toda vez que vou trabalhar e voltar pra casa porque o metro fica la. nao me incomodo porque o pessoal aqui eh completamente diferente. ninguem se importa com o povo e ninguem parece tah ali pra se exibir, mas algumas vitrines ainda escondem os precos de certas coisas. ;)

    mas vem cah:
    200 pau num anel? Oo

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  6. olha, quero acreditar que quem da 200 pau num objeto tao dispensavel tem tudo na vida. tu-do.

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  7. Luci,

    Tenho que admitir que o que me irrita em shopping não é isso, porque preços caros a gente pode ver numa vitrine na rua. Me incomoda a questão urbanística, da privatização de um espaço. Shopping é meio que a morte da cidade. E eu não queria parecer piegas, mas ao contrário de você, acho que é possível ter 200 paus pra dar num anel e só ter isso mesmo: dinheiro.

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  8. É sempre bom dar uma passada no seu blog! Excelente post. Falando em fascismo paulista, vc já viu o manifesto São Paulo para os paulistas? (http://www.manifesto.rg3.net/). O egoísmo e a estupidez humana parecem não ter limites... Por isso que é tão legal passar por aqui!

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  9. Este comentário foi removido pelo autor.

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  10. Valdson,

    Obrigada pelo elogio. Então, eu já tinha visto essa história e nem sei o que comentar. Só que a humanidade me deprime às vezes...

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