quarta-feira, 27 de abril de 2011

27 de abril - Dia Nacional das Trabalhadoras Domésticas

Fiquei sabendo da data pela lista de discussão das Blogueiras Feministas. Não queria deixar passar a data, porque eu acho que é importantíssimo discutir a questão desta classe de trabalhadoras. Mas daí, vocês sabem, eu sou uma sujeita meio sem-vergonha e preguiçosa. E a Bia fez este post incrível, completíssimo e cheio de informações úteis. Então, se eu fosse você, dava um pulo lá e, caso ainda não conheça, aproveite pra conhecer o blog dela que é luxo só.

Apesar da preguiça, cabe no mínimo a minha opinião sobre o assunto. Como a Bia disse lá e a gente sabe bem, o trabalho doméstico não é um trabalho como qualquer outro. É um trabalho que só existe porque existe desigualdade social, e um grupo de pessoas privilegiado pode se dar ao luxo de delegar a outrem tarefas que não lhe agradam. A desculpa que sempre ouvimos é: “mas eu preciso, não tenho tempo!”, “mas quem cuidará dos meus filhos?”. Daí que a empregada pode ser uma pessoa que também tem casa pra e filhos, mas ela que dê um jeito nisso tudo. O trabalho doméstico faz com nossas necessidades nos pareçam maiores que as necessidades alheias. Contraprodutivo para sensibilidade social, portanto.

Além disso, a terceirização destas tarefas atrasa em muito a discussão da divisão de tarefas. Porque olhem só, nas classes mais esclarecidas que poderiam ser “vanguarda”, a gente não precisa discutir nada. Os moços bem instruídos tem empregada na casa da mãe. Se saem de casa sem se casar, em geral contratam ao menos uma diarista. Se se casam, tem outra diarista lá. Sempre uma mulher cuidando das tarefas. “Mas Iara, peralá, ela só vem uma vez por semana, no resto sou eu que lavo a louça e coloco a roupa pra lavar.” Aham. Lava a cozinha? O banheiro? Limpa azulejo? Os vidros? Tira a poeira das estantes? Desengordura os armários? Provavelmente não. Faz o mínimo pra tocar a vida e a parte pesada fica com uma mulher mesmo. Logo, terceirizar essa tarefa é contraprodutivo para a discussão feminista. Como a Mary W disse em nossa lista, maridão lavar a louça no domingo não é divisão de tarefas, tá?

Bom, daí que apesar da desigualdade de classe e de gênero me incomodar, contrato os serviços de uma diarista a cada 15 dias. Por que eu sou cínica? É uma leitura possível, claro. Mas não acredito que o fato de não contratar alguém e gastar esse dinheiro com qualquer outra coisa resolverá, por si só, estas questões. Contratar, dizer que o mundo é assim e não pensar mais no assunto resolve menos ainda. Então tô aí. Pensando. Discutindo. Enquanto isso, o mínimo que se pode fazer é trazer à luz estas discussões e não deixar que esta classe, que justamente pelas condições em que este trabalho se dá tem dificuldade de se mobilizar coletivamente para reivindicar respeito, seja invisível.

Update:

Ah, sim, né? Preguiçosa demais, eu. Isso é uma blogagem coletiva e além do post da Bia linkado aí no texto tem esses muito bacanas da Denise:


http://drang.com.br/blog/2011/04/trabalho-domestico-faca-a-sua-parte/

E da Luka:

http://bdbrasil.org/2011/04/27/seja-empregada-domestica-ou-tercerizada-a-sina-e-a-mesma-invisibilidade/

O da Luka inclusive menciona a questão da terceirização da faxina. Por coincidência eu tô com um post semi-pronto sobre terceirizações no geral. Pretendo não enrolar muito pra terminá-lo e postá-lo mas, né? Oremos.

7 comentários:

  1. Não vejo problema em se ganhar a vida cozinhando, seja em casa ou em um restaurante; limpando uma casa ou um prédio, etc. Mas não dá para ignorar a estrutura perversa por trás do emprego doméstico no Brasil. E a figura feminina nesse pacote. E as crianças crescendo achando que sempre existirá alguém para limpar e arrumar a bagunça.

    Sou uma cabeça pensante em conflito.

    Bj
    Rita

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  2. Ó, flor, vc disse isso:
    "É um trabalho que só existe porque existe desigualdade social, e um grupo de pessoas privilegiado pode se dar ao luxo de delegar a outrem tarefas que não lhe agradam"

    Devo fazer ressalvas, assim:
    "É um trabalho que só existe" DA FORMA E NAS CONDIÇÕES EM QUE EXISTE NO BRASIL HOJE "porque existe desigualdade social, e um grupo de pessoas privilegiado pode se dar ao luxo de delegar a outrem tarefas que não lhe agradam"

    né?

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  3. "E as crianças crescendo achando que sempre existirá alguém para limpar e arrumar a bagunça. "

    Ritalinda, convenhamos que isso também acontece sem empregadas domésticas com mães ou pais que não ensinam isso, né?

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  4. Rita,

    Apesar de toda discussão lá na nossa lista, eu não consigo me convencer que é algo tão horrível assim. De verdade, se eu tivesse que fazer uma lista dos trabalho que eu não teria nunca, serviço doméstico não entraria. Mas quando penso nisso, penso na Cláudia, que trabalha lá em casa. E sei que a realidade dela não é a mesma da maior parte das trabalhadoras. Disso a gente não pode se esquecer nunca.

    Marília,

    Eu entendo o seu ponto, mas não sei se concordo. Sim, a gente pode projetar que uma pessoa que contrate uma diarista 2 vezes por mês teria condições de pagá-la exatamente 1/15 do próprio salário e as duas, teoriacamente, teriam o mesmo padrão de vida. Mas no geral não é assim e não só no Brasil, em lugar nenhum. Nos países em que o serviço doméstico é mais bem remunerado, quem tem condições de contratá-lo é quem tem uma renda superior à média mensal daquele local, justamente por isso é mais raro por lá. Então, a desigualdade ainda existe. Não é gritante como a nossa, mas tá lá. A gente tem que lembrar que é como no feminismo: melhorar de condição não significa mudar de posição.

    Sobre as crianças mimadas, também concordo em termos. Sim é possível, sendo rico ou sendo pobre, ter pais e mães que dão tudo na sua mão e tornar-se adulto sem ser responsável pelas próprias cuecas. Mas aí a gente tá falando de uma questão pessoal particular. Quando falamos da empregada doméstica estamos falando de uma questão econômica/ social: existe um grupo de pessoas que pode se dar ao luxo de, por mais sensível que seja às questões sociais, por mais que tenha sido educado pra ser autônomo e tratar as pessoas com respeito, não aprender a limpar o próprio banheiro porque tem R$70 por semana pra pagar quem o faça. Vi num outro blog que debatia o assunto um cara até muito radical politicamente dizendo que ele precisava ter faxineira porque tinha asma. Poxa, será que não há mulheres que fazem faxina e são asmáticas? Percebe o ponto?

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  5. Eu só tô passando para dizer um 'oi' e tuitar seu post.

    Se eu posso dizer que tem uma coisa que sempre me incomodou desde que me vi como gente, foi o uso de empregadas domésticas no BR. Talvez eu tenha ficado traumatizada com meu primo riquinho xingando a moça que era empregada doméstica e baba na casa de tia.As mulheres a minha volta sempre estavam comentando como a empregada era porca e que não fazia o trabalho direito. Pelo menos acho que elas não jogavam coca cola na cara da empregada como meu primo fazia. Sei também que a atitude do primo é um caso a parte. Mas me marcou. Daí a olhar as novelas com suas empregadas negras sendo representadas sempre servindo, e linkar com a realidade a minha volta, foi fácil.

    Eu nunca tive empregada doméstica. Já me falaram para trazer um 'isaura' do BR ( elas não falam a lingua e não sabem que podem pedir 25 dollares por hora trabalhada, enfim..) pra limpar minha casa nos EUA. As vezes é melhor escutar uns negocios desses do que ser surdo.

    Eu sempre vou comparar o lance da empregada doméstica entre BR e EUA. Eu vou ter ganas de dizer 'gente, dá para ter uma vida limpinha sem precisar de uma mulher limpar sua casa'. Mas isso nunca será possivel no BR em que homens não tirar um copo do lugar. E também tem de dar uma desacelerada na mania de limpeza e ter uma estrutura de produtos e maquinario. Aqui eu posso pagar 25 cents de dolar para lavar uma saca de roupas na lavanderia. Quer dizer, tem toda uma estrutura.

    Como a Iara colocou, se a dona que vem limpar a casa da gente dá um jeito de manter a propria casa limpa e as crianças cuidadas, então a gente pode dar esse mesmo jeito.
    E pense nos meninos bons de casar que esses rapazes se tornaram vendo que podem arrumar a propria cama e passar um aspirador no quarto.

    Se a economia brasileira está do jeitinho que estou lendo nos jornais e, os programas para a erradicação do trabalho doméstico infantil ( só um exemplo) vão bem, obrigada, então não tem pq ficar imaginando o que vai acontecer com as empregadas domésticas sem emprego domésticos.

    Ficou Poliana mas hoje amanheci assim.

    Viu, não passei só para dizer 'oi'.

    Beijos

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  6. porra, queria muito escrever sobre isso! a rita mandou um email dia desses pra gente jogar conversa fora falando justamente sobre o tema. polemico, hein. mas nem vou prometer a mim de fazer esse post, porque tenho uns duzentos posts rascunhados... pppff... prefiro ler o que voces tem a dizer!

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  7. Mari,

    Olha, eu não sei se os casos que vc conheceu são exceção não, viu? Taí o tragediadaempregada.tumblr que não me deixa mentir. Eu acho que essa é umas das relações de trabalho onde mais há abusos e assédios, especialmente porque ela ocorre no espaço privado, sem terceiros como testemunhas. Por isso eu tenho esse cuidado de não minimizar as condições em que isso ocorre mesmo se essa não é a experiência que eu testemunhei. Porque eu tenho uma tia de 80 anos que só recentemente se aposentou. E ela gostava de trabalhar. Gostava tanto que continuou, mesmo os filhos estando contra. Claro que a família pra quem ela trabalhava, a essas alturas, só lhe passava o trabalho mais leve, e não a remunerava menos por isso. Mas isso é exceção. E quem defende a manutenção desta categoria (ou pelo menos, de seu privilégio particular) deveria, no mínimo, defender que essa exceção se tornasse regra.

    Luci,

    Olha, bota polêmica. E claro, como "empregadora" me enxergaram por aí como uma pessoa que esta advogando em nome dos seus privilégios. Pra ser honesta com você, no meu mundo ideal, não haveria uma desigualdade de renda que permitisse a uma pessoa remunerar outra só pra manter sua casa em ordem. Mas o meu mundo ideal tá longe de existir e eu sou uma pessoa muito pragmática. Como eu disse por aí, ninguém me convenceu que mandar a faxineira embora vai trazer algum benefício concreto nem nome da causa. Por hora, sigo tratando as pessoas com o respeito e a dignidade que eu gosto de ser tratada, e me questionando a casa dia sobre minhas escolhas, porque nada é difinitivo.

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