sábado, 6 de fevereiro de 2010

Sobre leituras

Post que eu queria ter escrito na quinta-feira mas não consegui porque teve uma tempestade (oi Kassab e Serra, beijonãomeliguem ) e eu fui “obrigada” a fazer um happy hour com a rapaziada e cheguei de pilequinho. Queria ter feito ontem, mas o cansaço me derrubou. Hoje a preguiça é muita, mas eu sou mais forte. Acho.

Marido passou no vestibular. Ele começou Física quando era mais novinho, na idade em que as pessoas entram na faculdade, mas por uma série de motivos teve que parar. E agora vai fazer Letras. Tentou Sociais ano passado, não rolou, e esse ano mudou. E eu tô achando um barato, porque eu entrei em Letras 10 anos atrás, e eu achei a faculdade um tesão. Lógico que eu o influenciei muito. E vou me segurar pra não virar uma chata, pra deixá-lo curtir sua experiência independentemente da minha, sem comparações. Eu fiz Português e Espanhol, e ele quer Alemão, porque ele já fala, morou lá, faz Goethe, tem afinidade com a língua. Vai ser bacana.

Daí lembrei que a gente vê na faculdade a definição de “clássico”. Tem até uma matéria optativa (quer dizer, “no meu tempo” tinha), chamada “Porque ler os clássicos?”. E tem um professor que dizia que claśsicos são aqueles livros que a gente tem vergonha de dizer que não leu depois dos 30 anos. Quer dizer, os mais ou menos obrigatórios, ou como diria Harold Bloom (que eu sempre confundo com o Orlando Bloom, que cá entre nós é mais gateenho), o tal Cânone Ocidental.

E, putz, eu me formei em Letras na USP, mas li muito menos do que se esperaria de alguém nessa “condição”. E um professor dizia que a gente tinha que ler, que se a gente não lesse, quem mais leria nesse país? Eu leio muito mais do que a média nacional, óbvio. Mas não é difícil, né, porque a média tende a 0, mesmo entre a suposta elite do país. Eu sou formada em Espanhol mas só li o primeiro volume do Dom Quixote (vergonha!). E outro professor dizia que deveria existir um dispositivo que incinerasse o diploma de quem sai da faculdade sem ter lido o Formação da Literatura Brasileira do Antônio Cândido. Leitura básica, né? E, adivinhem, eu não li. Vergonha total.

E lembrei muito disso recentemente, dessa coisa da idade, porque eu sempre achei que a maturidade pode fazer muita diferença na formação, pode colaborar pra certas leituras. Então eu entrei na faculdade com 20 anos, enquanto muita gente entra com 18, mas acho que só “caiu a ficha” no 2° ou 3° ano. E eu sempre fui uma aluna aplicada, mas parece que rolou um refinamento mesmo. Pode não ter nada a ver com idade, e sim com a fomação: simplesmente aprendi a organizar o pensamento de acordo com o esperado pela Academia. O fato é que fluiu melhor depois de um tempo.

E numas de que agora não estou estudando e posso ler o que quiser, tô indo atrás dos gaps da minha formação, sem critério acadêmico, pensando só no que me interessa, o que é uma delícia. E nisso, li na últimas férias O Apanhador no Campo de Centeio. E foi engraçado. Porque eu não me empolgava, e fiquei pensando se não era como Saramago ou como o Grande Sertão Veredas, que só envolvem de verdade 50 páginas depois. Não me envolveu em momento algum. Eu me sentindo uma anta completa porque, pô, é um clássico. E o Salinger morreu no final de janeiro e todo mundo postando que, uau, o livro é o máximo. Mary W dizendo que o livro mudou a vida dela, quando ela o leu, aos14 anos. E eu pensei, “será?”. Será que há idade para ler certas coisas? Virei uma velha chata e conservadora, por isso “não bateu”? Ou sou só estúpida mesmo? Marido não se conforma de eu não ter curtido o On the road, por exemplo. Nem terminei, achei chatésimo, me dava sono. Entendo que o estilo de vida desse povo era super revolucionário em contraponto com o american way of life dos anos 50, mas, putz, não me empolgou. Pra sorte minha meu pai achou chato também, então se o problema for estupidez, pelo menos tenho a desculpa de ser genético. Fato é que eu prefiro Machadão a qualquer um desses caras aí, fazer o quê.

Falando sério, não acho que eu seja estúpida. Pelo menos não por isso. Há quem estude na faculade teoria da recepção, porque a obra é construída não só pelo autor, mas pelo leitor. Essa coisa de que, no começo, ninguém colocava em dúvida a infielidade de Capitu porque a única leitura possível para o público era que ela era uma vadia arrivista mesmo. Não tô querendo dizer que o rei está nu, eu descobri isso e tudo o que eu não gostei é uma bosta. Mas a leitura é uma experiência única pra cada leitor, nossa recepção tem a ver com a nossa história, as leituras prévias, etc. Por isso que o curso do marido vai ser completamente diferente do meu. Mesmo que cursássemos juntos a mesma matéria já dormindo na mesma cama, a experiência da leitura seria única. E por isso é um tesão, aliás.

13 comentários:

  1. Gata,
    Tentei ler O Apanhadador no Campo de Centeio certa vez e também detestei. hehe
    Bjos
    Mari

    ResponderExcluir
  2. Então, Maricota, detestar não detestei. Só me senti lesada. Tipo: "cadê aquele livro foda que me prometeram", sabe?

    ResponderExcluir
  3. Eu sempre quis fazer Letras. Mas amarelei e fiz Direito. Depois da formatura criei um pouco de espinha dorsal e fiz... Comunicação Social. Mas uma hora eu chego lá. Tô pensando se, ao invés de uma graduação, uma pós em Literatura não ia ser tudo de bom.

    Li o Apanhador e também achei chocho. Eu já quase trinta anos e não me identifiquei, não vi graça alguma. Mas enfim. Quando eu fazia Comunicação freqüentava muito a biblioteca da Letras, e lá um belo dia dei de cara com o Cânone Ocidental. O que me lembro do livro é que o Bloom era fãzoco do Shakespeare e sobre ele muito se estendia. E que na lista doirada do hômi tinha Neruda mas não tinha Machado de Assis, o que me deixou ofendidíssima. Ah, também me lembro que concluí que se fosse pra ler escritor-inventador-de-palavras eu preferia Guimarães Rosa ao chatonildo do Joyce =D.

    Mas eu acho legal e importante ler os clássicos, sim. Andei lendo "Casa Grande & Senzala" e "Formação Econômica do Brasil". Digamos que o último eu adorei e fiquemos nisso.

    Beijos!

    ResponderExcluir
  4. Lud,

    Bom te ver por aqui. Formação Econômica do Brasil está na minha lista de próximas leituras. O Harold Bloom é super criticado na Universidade por conta da sua arrogância em querer determinar esse cânone. Mas a gente sabe que o Machado não precisa desse tipo de aprovação.

    Putz, meu pai leu 700 páginas do Ulisses, na tradução do Houaiss. Faltando umas 80, ele desistiu. Eu nunca nem tentei ler Joyce. Quem sabe um dia, só pra não dizer que não tentei.

    E é reconfortante saber que há mais gente que não se empolgou com "O Apanhador". Ufa! Pelo menos estou em boa companhia \o/

    ResponderExcluir
  5. Oi, Iara

    Fiz Letras (Inglês) e acho que nem que eu viva vinte encarnações vou conseguir dar conta das leituras pendentes. E talvez por estar afastada da Academia há alguns anos minhas escolhas nem sempre seguem a minha "lista de prioridades" e, apesar de não ter lido nem um centésimo dos clássicos que gostaria, vira e mexe me dedico à leitura do último best seller. Mas, olha, botei a culpa na gaveta. Se eu pudesse, deixaria de trabalhar para passar o dia no sofá, cara pra baixo, nariz nos livros. Mas essa não é exatamente uma opção para mim e paciência. Então vou lendo por prazer o que me der na telha.

    Quanto ao Apanhador, parece-me que o livro é mesmo voltado às tais rebeldias adolescentes (não é?) e talvez isso explique um pouco o porquê de tantas leituras menos empolgantes entre os adultos. Pitaco puro e simles, tá? Pode não ser nada disso, obviamente. Quanto ao Saramago, já me rendi e agora ele me fisga, via de regra, na primeira página. :-) E o Bloom me parece mesmo um arrogante (o Harold, não o Orlando), mas ele leu muito mais do que eu, então quem sou eu, huahahaha.

    E como eu não paro de falar, vou ainda dizer que, para quem segue pelos caminhos da Academia, ler os clássicos pode fazer, sim, toda a diferença. Porque é um saco (sem falar de ser muito arriscado) passar todo o tempo baseando nossas impressões em opiniões de segunda e terceira mãos, não é? Tipo, Fulano disse que Nietzche disse... oia o perigo... Lembro que tive de reescrever boa parte de minha tese de doutorado porque estava comprando um leitura equivocadíssima de uma certa acadêmica e tal. Fui à fonte e fez-se a luz. :-P

    Parabéns ao maridão pela aprovação e sucesso a ele no curso lin-do que ele escolheu.

    E parabéns a você pelo blog. Voltarei.

    Bjs,
    Rita

    ResponderExcluir
  6. Ah, o JOYCE: experimenta um conto, de aperitivo. The Dead. Uau.

    Bjs

    ResponderExcluir
  7. Rita,

    Bacana te ver por aqui. Também já andei dando uma olhadas no seu blog, só não tinha comentado (mas hoje eu comentei!). Achei tão fofo o post sobre a sua tia.

    Então, nem fico muito culpada mais, porque nem que eu fosse imortal, né? E tinha um professor que dizia que a gente deveria comprar livros como se não fosse morrer nunca, e ler como se fosse morrer amanhã.

    Vou colocar o conto do Joyce na lista. Quando ler, te conto. Mas você não tá com pressa, né?

    Obrigada pelos parabéns. Marido agradece também . \o/

    ResponderExcluir
  8. Olha, identificação TOTAL. Também sou formada em Espanhol (eu queria fazer direito, ainda bem que cai fora a tempo..hahaha), e sempre digo que o curso me ensinou a pensar.

    Leio muito, mas esses que seriam os clássicos li pouco. Quixote nunca li. Tá aqui uma edição comemorativa da Espasa e ainda não me debrucei. O Mio Cid li grandes trechos, mas não a obra toda, nem li Antonio Candido (mas sou linguista, a literatura me interessa mesmo como leitora, não como teórica).

    E a minha lista de leituras atrasadas é I-M-E-N-S-A. Affff :(

    ResponderExcluir
  9. Daniela, linguista, é? Luuuuuxo! Acho muito bacana, linguística é quase matemática. Tenho o maior respeito.

    Mas ó, sabe o grande lance de ter leituras atrasadas? A gente nunca vai poder dizer que entediou, não tem nada pra fazer. Uma professora de literatura portuguesa dizia que invejava um pouco quem nunca tinha lido nada do Saramago, porque a pesso tinha a oportunidade de ler tudo ainda, e pela primeira vez. É um ponto de vista interessante, né?

    ResponderExcluir
  10. Epa.
    Leitura atrasada é comigo aqui.

    Iara, legal pra vocês. Pra ele em especial.

    Eu tou louca pra ler O Apanhador, mas tá na minha listinha de 'procrastinação'. Uma hora rola.
    Sabe, até já desisti de me cobrar, pq não dá tempo meeeesmo.


    Beijossss

    ResponderExcluir
  11. Vanessa,

    Depois que você conseguir ler "O Apanhador" volta aqui pra me contar se você é da minha turma, ou da da Mary W. (ó eu, a pretensiosa!). Bjo!

    ResponderExcluir
  12. Iara,

    eu li as 15 anos, o livro é legal, mas eu não entendo chamarem de livro "rebelde"... pra mim, é um livro reaça, conservador, conformista...

    ResponderExcluir
  13. Oi Alex,

    É, se a gente considera que o Holden foi internado, é bem conformista e reaça mesmo, porque não há espaço pra ele no mundo. E no fundo a gente sabe que não tem nada de errado com ele. Quer dizer, eu pelo menos li assim, ele é um cara mais sensível que a média, menos fácil de domar, mas numa sociedade extremamente opressora virou "o garoto enxaqueca".

    Quando eu falei de rebeldia, pensei no "On the road", que eu sei que você gosta bastante. E eu só achei chato mesmo.

    ResponderExcluir