terça-feira, 15 de maio de 2012

Os novos rumos do menino Poizé – ou sobre carros, de novo


Ano passado escrevi dois posts muito comentados (pros padrões deste blog modesto) sobre nossa decisão de ficar sem carro. Alguns meses depois, fizemos um novo contrato de leasing e trouxemos para garagem Poizé, nosso meio de transporte durante a maravilhosa jornada até Ushuaia. Essa semana o contrato acabou e, depois de nos servir tão bem, de rodar por tantas estradas de terra nos confins da Argentina, de ter a porta quase arrancada pelo vento patagônico, nosso companheiro de aventuras volta pra concessionária da marca (nota: propaganda de graça, não trabalhamos). Ficamos aqui imaginando que se ele pudesse falar, ia contar vantagem para os coleguinhas: “Qual o lugar mais longe que você já foi? UBATUBA? Se liga, ô, cruzei os Estreito de Magalhães de balsa. Vai lá no mapa ver onde fica e depois a gente conversa.”

Menino Poizé, todo trabalhado no uso sustentável - aka capacidade máxima

Mas voltar a ficar sem carro me fez reler os posts e repensar algumas questões. Semana passada estive em Brasília em um seminário da Capes sobre os problemas da metropolização brasileira. E em algum momento, perguntaram ao professor Carlos Correia da Fonseca, da Universidade Tecnica de Lisboa, o que ele achava de medidas punitivas para o uso do carro. E ele se incomodou muito com o termo “punitivas”. Para o expositor, o carro é uma conquista do nosso desenvolvimento, não é um vilão. O problema do carro é que, da maneira como é usado, traz grandes prejuízos de maneira coletiva para alguns benefícios privados.

Explicando melhor. No post do ano passado, falei sobre os custos de se manter um carro. De que achava caro e tal. Mas a questão é que o carro ainda é mais barato para seu proprietário do que para o resto da sociedade – incluindo aí as pessoas que nunca vão ter carro na vida. Ano passado mencionei, por exemplo, que o IPVA tributa a propriedade, mas não o espaço que você “empata” quando deixa o carro estacionado na rua. Mas esse é um exemplo bem primário. Nem o IPVA, nem o ICMS sobre o combustível é suficiente pra cobrir os gastos públicos com as doenças causadas pela poluição. Tenho minhas dúvidas também se o DPVAT, o seguro obrigatório, dá conta de todo o ônus a longo prazo gerado pelos acidentes e mortes no trânsito (embora ele exista pra cobrir despesas imediatas), mas como não tenho esses dados aqui a mão, deixo só o questionamento mesmo.

Bom, daí alguém pode argumentar que esses ônibus caindo aos pedaços que circulam pela cidade emitindo fumaça preta são mais poluentes do que carros novos com catalisadores. Mas além da questão óbvia de que um ônibus transporta muito mais gente, qualquer cidadã(o) tem o direito de se utilizar do transporte público, tendo inclusive gratuidade garantida em alguns (poucos) casos. Carros particulares são de uso... particular. E, do ponto de vista do pagamento de tributos, não faz diferença se você circula no seu carro todo dia sozinho ou se apenas leva a família pra passear com o carro cheio nos finais de semana (uso muito mais sustentável). Não se tributa o uso, mas a posse. Há alguma tributação indireta por meio do ICMS dos combustíveis, mas de novo, em termos de prejuízos coletivo é completamente diferente usar o carro individualmente nos horários de pico de segunda a sexta e fazer um passeio com a família aos sábados, embora os trajetos possam ser equivalentes. 

Então um desafio da gestão pública é esse, entender que o transporte individual gera um ônus social muito grande pra que este custo não seja captado integralmente de forma privatizada, já que não é justo obrigar quem não se locomove assim a arcar com esta despesa. E claro, oferecer alternativas sustentáveis que desestimulem o uso do automóvel, pra que as pessoas até comprem um se lhes for conveniente, mas sintam que não é vantajoso utilizá-lo em todos os momentos. Menino Poizé saía de casa para visitar meus pais no outro lado da cidade aos domingos, ir a São José do Campos, onde vivem os pais do Daniel, em outros finais de semana, majoritariamente. Umas poucas e raras vezes (não devem ter chegado a 20 em uma ano) fez o trajeto Pinheiros-Berrini (ou seja, casa-trabalho). Além, é claro, de ter ido até Ushuaia e voltado.

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