segunda-feira, 26 de julho de 2010

Tudo jóia?

Quinta-feira passada, ainda de férias (voltei a trabalhar hoje) resolvi dar uma volta. Acabei no Shopping Iguatemi. Pra quem nunca ouviu falar, ele foi o primeiro construído em São Paulo (então é provável que tenha sido o primeiro do país). Até outro dia, era o mais caro e elegante. Eu tenho uma certa relação afetiva com ele porque o meu primeiro emprego de verdade, mais de 10 anos atrás, era na região, e eu almoçava lá de vez em quando. Era engraçado, porque apesar da pompa, tem duas lojas bem populares na entrada. Aquela coisa, né? Se tem MacDonald's e C&A mesmo os funcionários mais modestos dos prédios ali por perto conseguem consumir alguma coisa lá dentro.
Só que este shopping fica numa avenida movimentada e servida por muitas linhas de ônibus. Apesar da elegância que pode ser opressiva para alguns, o prédio é acessível, geograficamente falando, pra qualquer pessoa. Por isso mesmo desconfio que ele perdeu o posto de bambambam: há um agora em que só se entra de carro. Deve ter uma entrada nos fundos pra funcionários, mas a coisa é bem hierarquizada mesmo. O estacionamento custa uns 30 reais a primeira hora. E fica num grande empreendimento com edifícios residenciais e comerciais também. A idéia é que você saia o mínimo possível, e só conviva com quem tem outra realidade quando estas pessoas estiverem te servindo, claro. Do tipo de coisa que me faz ter muita vergonha alheia por quem escolhe isso pra si, sabe? Colocam um muro enorme entre eles e o resto do mundo e se espantam com a violência depois. Eu sei, eu sei, outras cidades podem ter aberrações neste sentido também, mas às vezes parece que São Paulo é hour concours em facismo.
Mas, enfim, o Iguatemi não ficou popular por ser menos esnobe. Muitas grifes de alto luxo estão lá. Você acha caro um sapato de 200 reais? Lá tem de 2 mil ou mais. Mas o motivador deste post foi uma vitrine de joalheria. Olha só, eu sou super crítica a respeito da acumulação, acabei de assistir "Diamante de Sangue", mas eu acho jóias bonitas. Não como objeto de desejo, entendem? Acho bonito o trabalho de criação, o design mesmo. Nem olho desejando, pensando: "ó, um dia eu quero ter isso", porque não vou e não quero. Nada a ver comigo. Consigo excluir toda a ideologia por trás e achar bonito de ver, como quem vê uma obra num museu. Só.
Se mais alguém tem essa curiosidade, já deve ter reparado que os preços das coisas realmente sensacionais não são mostrados, mesmo que as peças estejam expostas na vitrine. Essa loja do Shopping Iguatemi tinha uns anéis com solitário de brilhante. Sabe daqueles de filme do mocinho que pede a mocinha em casamento e dá o engagement ring?. Então, tinha uns três assim lá. Os mais simples custavam 20 mil reais. O maior custava 200 mil. O preço tava lá, pra quem quisesse ver.
Eu fiquei muito triste depois de ver o preço deste anel. Bateu aquela coisa ingênua até de "tanta criança aí passando fome e madame colocando 200 paus no dedo". Depois fui mais longe nas reflexões e pensei que nada impede um cara de comprar um destes de presente pra uma mulher e tratá-la como lixo - embora de maneira nenhuma eu esteja estabelecendo alguma relação de causa e consequencia entre as duas coisas, que fique claro. Tem uma música do Skank, Os Ofendidos, que diz assim: "o mundo não me assusta/ o mundo só me insulta". No meu caso, as duas coisas, viu? Assusta muito e insulta mais ainda.

domingo, 25 de julho de 2010

Leituras feministas - A Dominação Masculina

Continuando, o segundo livro lido nos dias em que tive de ficar em repouso absoluto foi "A Dominação Masculina", do Bourdieu. Este foi presente de aniversário do meu pai que, depois de aposentado, ao 60 anos de idade, prestou vestibular, voltou pra faculdade e este semestre se formou em Ciências Sociais na USP. Então, faz muito sentido pra ele me presentear com uma obra de um sociólogo.
Enfim, mas o livro explica como o patriarcado está arraigado em nossas relações e nossos costumes de um maneira muito mais poderosa do que normalmente identificamos. Que toda a nossa organização de mundo parte de papéis masculinos e femininos bem definidos e hierarquizados. Daí que só a conscientização das mulheres de sua condição de dominadas não seria suficiente para reverter sua condição, sem que fossem feitos importantes mudanças na estrutura do mundo.
Eu sei que o Bourdieu enfrenta muita resistência de algumas feministas. E eu acho que sei porque, mas não sei se vou conseguir explicar. A questão, pelo meu ponto de vista, é este rótulo aí de dominadas. Como se isto fosse realmente imutável e definisse nossa condição no mundo. Eu entendo muito bem o que ele quer dizer quando foca na estrutura e eu concordo bastante. Se não olharmos as coisas assim, repetimos aquele discurso supostamente bem intencionado de que "homem machista é horroroso, mas mulher machista é pior". Essa atribuição de toda responsabilidade à nós, como se pudéssemos gente acordar um dia, ler "O Segundo Sexo" e concluir: "mas que canalhas estes meninos, a mim não enganam mais". Eu já falei aqui que este mundo é machista e a gente não vive teorias. Eu me esforço bastante para refletir sobre minhas atitudes, pra me questionar, mas minha vida é conservadora e me pego agindo tal qual o mundo machista acha que eu devo me portar. Nossas referências são externas e é um exercício desconstrui-las, criticá-las. Ainda que nos esforcemos para passar valores diferentes às novas gerações, a família ou mesmo a escola nunca são a única referência de uma criança. E ela vai, a cada dia, se deparar com mais e mais mensagens, explícitas ou não, que demarcam seu espaço na sociedade. O Bourdieu tem até uma teoria, que eu achei bem sacada, que a suposta intuição feminina viria daí: pra ter aceitação social a gente tem que se submeter a mais condições do que os homens, e essas condições nem sempre estão explicitadas. Logo, passamos a ser especialistas em comunicação não-verbal,
Mas ao mesmo tempo em que entendo o discurso do autor e acho muito válido, no me gusta pensar que não temos poder pra mudar isso. Porque se o poder não está todo em nossas mãos, com certeza há uma parte que está. E eu não posso mudar o mundo, mas posso criar conflitos que obriguem as pessoas a se posicionarem, posso desnudar o que está muito bem escondido. Eu sei, pra milhares de pessoas lendo blogs feministas que escancaram o machismo de como a mídia está tratando o caso Eliza, há milhões de pessoas vendo a grande mídia e atirando suas pedras a mais essa Madalena. Então não mudaremos o mundo e o patriarcado de maneira imediata. Mas as vozes dissonantes são importantes, porque elas marcam o conflito. Por isso, não gosto de me pensar "vítima" ou "dominada". Acho que as mulheres que querem resistir devem ser pensadas como resistentes mesmo, como tripulantes de um barquinho modesto que remam contra a corrente. Uma corrente poderosa e hostil, mas cada vez que alguém se dispõe a remar junto para o lado "errado", dá a sua contribuição para irmos mais longe. Acabei de pensar que esta é uma analogia péssima porque o fluxo de um rio é algo natural, tentar alterá-lo pode causar um desastre natural e esse é exatamente o argumento do patriarcado: que o feminismo quer alterar regras impostas pela natureza. Mas vocês vão me dar um desconto, sei que entenderam que eu defendo sermos nós parte da transformação, e não passivas nestas circunstâncias. Aliás, este lugar da passividade é tudo o que não queremos.
Ok. Estou sendo um pouco injusta com o Bourdieu, porque no livro ele trata de enfatizar que é preciso, justamente, historicizar o discurso da dominação, para que ele não seja visto como eterno e com isso, imutável e absoluto. Que o serviço prestado pelas instituições (escola, igreja, estado) ao patriarcado é justamente naturalizar nossa condição de inferioridade, enquanto o discurso feminista o quetiona, forçando sua entrada à esfera do, como ele diz, "politicamente discutível". Mas ficou pra mim a impressão de que ele é bem cético em relação ao ativismo feminista, ainda que reconheça alguns de sucessos.
Enfim, texto modesto para um livro importante. Pra quem não leu, recomendo. Este é traduzido e fácil de encontrar.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Leituras feministas - "Testo Yonqui"

O título já é instigante. Só lá pela metade eu saquei que a idéia era ser "junkie" de Testosterona, no sentido de se viciar. Que "yonqui" é a gíria espanhola equivalente ao "junkie" inglês. Enfim, a Beatriz Preciado é uma filósofa que estuda gênero e teoria "queer", que vem a ser o comportamento de quem não é, ainda segundo o inglês, "straight". Ou seja, quem foge a equação pênis = homem = masculino / vagina = mulher = feminino e heterossexual. Ela é espanhola. Quem me deu o livro foi a Fe, amiga minha inteligentíssima que fez um mestrado no museu de arte contemporânea de Barcelona. A Beatriz foi foi professora dela.
E eu adoro livros que me provoquem muito. Porque eu posso escrever um blog, ter umas idéias mais arejadas e tal, mas eu não tenho nem dúvida de que o meu modelo de vida é super conservador. Sou funcionária de multinacional, heterossexual, vivendo numa relação estável e monogâmica com um homem um pouco mais velho, mais alto e que ganha mais do que eu. Já fui secretária, estudei francês na França e me sustentei como babá, enquanto marido, antes de me conhecer, morou na Alemanha e projetando aviões. Sentem os modelinhos padrão masculino e feminino bem desenhadinhos? Então não é porque não somos dependentes de automóvel, não temos discurso retrógrado que somos "modernos" ou revolucionários.
Mas a Beatriz Preciado é, e como dizem por aí, "dicumforça". Ela é lésbica, se identifica mais com o gênero masculino (pelo o que eu entendi), mas acha que essas definições de gênero são autoristarismo estatal. Então não, ela não pretende fazer nenhuma cirurgia de mudança de sexo, nem deixar de ser Beatriz. Mas ela começa a se aplicar testosterona como experiência, meio que revivendo o percurso de Freud com a cocaína e de Walter Benjamin com o haxixe. Não sei se todo mundo sabe, mas homens e mulheres fabricam testosterona e estrogênio, o que muda é só a quantidade destes hormônios. Então, a testosterona não vai tranformá-la num homem, mas reforçar certas características consideradas como masculinas, como a quantidade de pelos no corpo, o cheiro do suor e a voz, por exemplo. E ela reivindica esta experiência como um direito inalienável de qualquer cidadão, o de poder se relacionar com seu corpo à sua maneira.
Enquanto se aplica testosterona, ela defende sua tese de que vivemos numa sociedade "farmacopornográfica". O que o carro representou para a economia e o comportamento no século XX, a pornografia e a indústria farmacêutica o fazem no século XXI. E eu não poderia concordar mais, principalmente quando ela, numa analogia das melhores, diz que as drogas ilegais são para a indústria farmacêutica o mesmo que a pornografia é para a indústria do entrenenimento. Ambas são variantes extremas e carentes de "status", mas subproduto de instituições sólidas. Muitos filmes não são pornográficos, não explicitam nada, mas as fantasias estão ali, o objetivo continua sendo gerar excitação sexual no espectador. Na TV a cabo essa semana tava passando um filme com o Tommy Lee Jones em que ele faz um policial que tem que proteger 5 cheerleaders gostosonas testemunhas de um crime. Ce vai me dizer que isso não é fantasia erótica de marmanjo? As moças de sainha e o cara com a arma sempre na mão? Só porque tá todo mundo vestidinho e pode passar na sessão da tarde não é de sexo que estamos falando?
E os remédios. Aqui é onde o livro manda melhor, na minha opinião. Porque se o transgênero toma hormônios, a irmão toma anticoncepcionais, mamãe na menopausa faz reposição hormonal, papai toma Viagra e o caçulinha Ritalina (pra quem não sabe, é o remédio mais popular pra crianças diagnosticadas como portadoras de déficiit de atenção e hiperatividade). Sem esquecer, claro, os antidepressivos. Preciado critica o feminismo por ter acolhido e celebrado a pílula anticoncepcional, sem pressionar pelo desenvolvimento e adoção de outras políticas contraceptivas. E aqui ela força a barra, na minha opinião. Porque a pílula não é bacaninha e inocente mas acho que ela é uma conquista, sim.
Mas a pílula. Então, meu problema de varizes foi agravado por ela. Eu sei disso. Fiz uma escolha consciente. Não me arrependo, prefiro ter feito essa cirurgia agora mas ter passado os últimos ano sabendo que estava protegida de uma gravidez não desejada. Mas com isso, só duas vezes cliente da indústria farmacêutica, exponho o meu corpo duas vezes. Ainda que ela esteja se aperfeiçoando e os efeitos colaterais sejam menores agora, eles existem. Entre eles, adivinhem? A queda da libido. Quem vem a ser um efeito colateral do uso de antidepressivos também. Lembro de um dia, anos atrás, em que jantava com um grupo de amigas. Todas inteligentes, viajadas, independentes. Todas a seis já tinham tomado antidepressivo em algum momento da vida (eu inclusive). Muita gente toma antidepressivo no mundo, e acho que são as mulheres as maiores usuárias. E muitas mulheres tomam pílulas. A gente comenta do absurdo de antigamente, quando se lobotomizava mocinhas inconvenientes. Hoje não precisa: a gente dopa todo mundo e beleza. Somos uma geração de mulheres infertéis quimicamente e que só tem tesão pra transar com o namorado - quando tem. Não é o paraíso machista por excelência? Ela questiona porque nunca se pensou em ministrar pequenas doses de testosterona para mulheres que tomam pílulas, para resgatar a libido. Mas é super mal visto politicamente. Como se a testosterona e a excitação sexual decorrente dela nos fossem proibidos. E a desculpa par não terem chegado a um equivalente feminino do Viagra é que nossa sexualidade é muito complexa. Mas doses mínimas de testosterona poderiam ser eficientes sem grandes alterações físicas. O livro conta (pág 144-146) que em 2004 o FDA, orgão amaricano responsável pela fiscalização de medicamentos, não autorizou o lançamento no mrcado de um patch de testosterona que seria ministrado pra mulheres que estivessem com a libido em baixa por conta da menopausa - mas claro que as que usam anticoncepcionais poderiam ser futuras consumidoras. Enfim, é o estado quem te diz que drogas a gente pode consumir ou não, a decisão é sempre política.
Olhem só, acho o uso de medicamentos muito legitimo em diversas circunstâncias. Acho que são muito úteis, e já vi pessoas queridas que estavam muita mal consiguirem se recuperar com a ajuda deles. Mas a última vez que me prescreveram antidepressivos eu estava só ansiosa e angustiada por questões externas, mas especificamente por não saber o que fazer quando terminasse a faculdade, coisa que acontece com todo mundo. E eu não tomei, continuo uma pessoa ansiosa e angustiada por diferentes motivos, mas posso viver com isso. Hoje, quando minha ansiedade bate forte, tomo um fitoterápico a base de maracujá, daqueles que não precisa nem de receita e pode dar até pra criança.
Enfim, não era pra ser tão longo esse post. E nem é uma resenha de verdade. Mas o livro traz reflexões interessantes sobre fenômenos contemporâneos da maior importância. Se alguém se interessar, só achei disponível no original em espanhol, infelizmente.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O surreal, o selo e as leituras

Eu queria comentar aqui do quanto é tudo meio surreal no hospital. Primeiro, porque se internar assim, passando bem, entregar o seu corpo pra ser manipulado com plena consciência é muito estranho. Fiquei quase uma hora numa sala de pré-cirurgia. Levei um livro bom (vou falar dele mais abaixo), que me fez companhia. Depois entrou a enfermeira com a camisola de cirurgia. Aberta atrás, como vocês sabem, mas descartável, de um tecido ridiculamente fino e completamente transparente. E tive que tirar toda a roupa e vestir aquilo. Daí veio um cara numa maca me buscar, e eu lá, quase pelada, bunda de fora. Deitei na maca e, no passeio até o centro cirúrgico, olhando pro teto, como nos seriados médicos, fui vendo as luminárias passarem. Depois da cirurgia, acordei da sedação, mas ainda estava anestesiada. Vi o meu médico segurando uma perna enorme, enquanto a instrumentadora a enfaixava. Uma perna comprida, grossa, com um pé bem grande (38 ou 39, parecia). Daí me dei conta de que era a minha perna... Quando marido chegou do trabalho e foi ao quarto me encontrou com a camisola cirúrgica e falou: "olha, você tá quase pelada". Pra ele eu sou alguém, pro resto do pessoal que me viu assim, só um corpo.

***

Olha, eu realmente sou péssima com a história dos selos, mas eu juro que eu tento ser uma pessoa legal e corresponder ao carinho das pessoas porque é o mínimo que elas merecem. Daí que a Rita me deu esse aqui quando eu estava meio offline.




E a Ingrid me deu esse.



Que acompanha este texto:

"O Prêmio Dardos é um reconhecimento dos valores que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc... que em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, e suas palavras.
Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os blogueiros, uma forma de demonstrar o carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web".

Obrigada mesmo, gente. Acho que o ideal é que eu indique alguns blogs, né? Então, eu leio coisas muito diversas entre si, como dá pra ver ao lado. E eu gosto muito do blog da Rita, e acho que ela é uma boa cronista. Fala do cotidiano de uma maneira deliciosa, me faz bem lê-la. Eu adoro o desbocamento da Luci. A lucidez da Dani. Mas tem um que eu acho que pouca gente aqui conhece e eu tenho que indicar. O da Aline. A Aline tinha outro e fechou, descurtiu de escrever por um tempo. E eu era assídua lá. Tava sempre comentando, comentários enormes. Meus debates com ela me ensinaram muito, principalmente quando discordávamos. Não tem nada que nos ensine tanto como buscar argumentos para discordar de alguém inteligente num debate respeitoso. Depois de um tempo, resolvi criar o meu blog porque cheguei a conclusão de quem, sim, eu tinha coisas a dizer, e eu queria eu mesma "puxar" o papo para dizê-las (e a maior prova de que valeu a pena são, justamente, estes selos). Então, a Aline me inspirou e eu recomendo que vocês passem lá pra serem inspiradas também.

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Por fim, leituras. Eu não comentei no último post sobre livros, mas eu tenho um novo sonho de consumo. Há uma coleção que se chama "Mar de Histórias", coletânea de contos organizada por Aurélio Buarque de Hollanda e Paulo Rónai. Eu li um conto na faculdade e me encantei com a ambiciosa idéia de uma antologia do conto mundial em 9 volumes, até porque conto é meu gênero literário preferido. Só que esta coleção está fora de catálogo. Mas outro dia me apresentaram ao estante virtual, um site para buscar livros em sebos de todo o país. Daí achei exemplares de todos os volumes, por preços honestos. Vou comprando aos poucos, que eu não sou rica, e porque também é mais gostoso assim. O primeiro chegou direitinho, e me fez companhia no hospital. Companhia excelente, vale dizer. Essa semana acho que vou encomendar o segundo. O plano é completar a coleção em 1 ano mais ou menos.

E o devaneio: o conto que eu tive que ler no meu primeiro ano na faculdade, 10 anos atrás, se chamava "Terremoto no Chile". Daí, esse ano, quando teve o terremoto, eu entrei na internet, vi um link discreto ainda (daqueles que colocam quando não tem maiores informações) e cliquei achando que era uma resenha do conto, não a notícia de um desastre natural real. Lembrei da coleção e me despertou a vontade adormecida de ter os livros. As associações que nossa cabeça faz...

sábado, 17 de julho de 2010

A cirurgia

Eu não sumi por conta do meu trabalho. No final das contas, eu entreguei só 4 páginas, solidária ao resto da minha turma que, no geral, não tinha nem escolhido o tema dias antes da data da entrega (mas uma das colegas entregou 32 páginas, já!). Sumi principalmente porque o computador deu pau e foi pro conserto (estou escrevendo do do marido) e porque eu tava concentrada em me preparar para o que aconteceu na última quarta-feira: minha primeira cirurgia.

Eu tenho problemas leves de circulação desde a infância. Vasinhos que se tornaram varizes. Imaginem uma menina de 11 anos sofrendo bullying porque tem varizes. Foi bem chato, viu? Eu já tinha feito diversas vezes a parte estética, de "queimar" os vasinhos aparentes, desde a pré-adolescência. Na idade adulta a pílula piorou um pouco a situação. E eu cresci morrendo de vergonha das minhas pernas. Na minha primeira viagem à Espanha, quase 10 anos atrás, passei os 30 dias de calor de 40 graus usando calça jeans. Eu jamais usava saias, bermudas, vestidos. Nem tinha nada disso no meu guarda-roupa. Até que um dia me caiu a ficha de que as pessoas tinham muito mais o que fazer do que olhar para as minhas pernas. Então mandei tudo a merda e desencanei. Hoje tenho um montão de saias e vestidos, que eu acho que me vestem melhor do que as calças, aliás.

Mas recentemente descobri que o problema não era só estético. Minha circulação estava ficando comprometida. E isso, com a idade, só tende a piorar. Eu tinha que fazer mesmo a cirurgia ou corria o risco de, a médio prazo, ter problemas mais sérios. Não vou ser hipócrita: eu ainda me incomodava com a parte estética, mas muitíssimo menos do que na adolescência. E a parte estética só exige este procedimento clínico de injetar uma substância que "queima" os microvazos, quase indolor e sem risco. O convênio não cobria mas nem era muito caro, então aproveitei que ia estar anestesiada pra fazer tudo de uma vez.

E, bom, a anestesia. Eu tava morrendo de medo. Muito mesmo. Nunca tinha tomado, a não ser no dentista. Não precisei da geral, só a "raqui", aquela que te desliga da cintura pra baixo. Mas eu tinha muito medo mesmo. Nos últimos dias eu fiquei pensando que, fosse só pela parte estética, eu desistiria. Olha só, eu sou vaidosa e tal, mas passar batom e rímel é muito diferente de se internar num hospital voluntariamente. E, por favor, eu não estou julgando ninguém. Eu tenho amigas queridas, mulheres muito inteligentes e bem resolvidas, que fizeram cirurgias plásticas. Uma delas fez lipoaspiração, que é um troço invasivo pra caramba, muito mais do que as minha de varizes. Eu realmente acho que o discurso de que ninguém deve fazer é tão reacionário quanto o discurso de que todo mundo pode/deve fazer. A nossa relação com o próprio corpo deveria ser o mais pessoal e o menos mediada possível. Não cabe a mídia nem ao discurso feminista de esquerda me dizer como eu devo me relacionar com o meu corpo. Mas eu sei que boa parte das mulheres que se submetem a procedimentos caros e arriscados estão agindo sob muita influência externa ao tomar sua decisão - e não é o discurso feminista que as influencia, vale ressaltar.

Quando eu era mais nova, dizia que odiava minhas pernas. Além dos vazinhos, e também por conta da má circulação, eu tenho muita celulite. Sempre tive. E um dia eu me dei conta que são as minha pernas gordinhas, riscadinhas de vermelho, azul e roxo tal qual o mapa rodoviário federal e tortinhas como as do Garrincha (sem falar do joelho meio podre, claro) que me levam pra cima e pra baixo. Que eu já andei quilômetros por aí com elas, que elas já carregaram muito peso (meu e das minhas mochilas), e que na verdade é essa a função delas. Elas estão aqui pra me carregar, não pra servir de enfeite para os olhos alheios. Então, cabe a mim respeitá-las, poxa vida!

Mas pra que continuassem cumprindo sua função eficientemente, eu tive que operá-las. Ok. E foi tudo muito tranquilo, apesar de parecer meio surreal. Nem lembro da anestesia (eu já estava sedada quando aplicaram), voltei pra casa no mesmo dia, tudo numa boa. Por sorte, está fazendo frio em São Paulo, já que eu tenho que ficar deitada, com as pernas pra cima e usando meias kendall. O repouso está terminando, a dor está passando e só as meias piniquentas me acompanharão por mais umas 2 semanas. Nem é um pós operatório dos piores. Tirei 10 dias de férias do trabalho e estou pondo a leitura feminista em dia. Enquanto isso, tenho a sorte de ter um maridão dedicado cuidando de mim com todo o carinho do mundo. Maridão esse que conta só ter reparado que as coxas grossas eram "uma delícia" quando me viu de saias. Nem notou as varizes lá. E eu acredito, viu? O olhar do outro pode ser mais generoso do que o nosso.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Somos todas Elizas

Sumi, né? Meu computador tá uma droga. Fica desligando enquanto eu escrevo. Foi um custo fazer meu trabalho.

Mas eu sou quero dizer uma coisa: Eliza somos todas nós. A gente não pode nunca comprar essa história de que fez isso, aquilo, era maria-chuteira, o que seja. Que qualquer coisa que ela tenha feito possa justificar seu assassinato.

Quem aí briga pra viver sua sexualidade livremente apesar do machismo da sociedade? o/

Quem aí acha que filhos, planejados ou não, não foram feitos só por suas mães, e que portanto têm o direito de terem pai? o/

Viu?

"Dividir para conquistar", a gente tem que estar atenta e lembrar sempre que é disso que se trata. Que o Bruno deu entrevista tentando convencer de que a Eliza não era como as filhas dele. Que não era como a leitora de classe média conservadora. Que sua vida valia menos. Que eu e você não corremos esse risco porque não somos "maria-chuteiras", não fazemos sexo grupal nem filme pornô.

Mas é verdade é que corremos, viu? Eu, você, a Eliza, a Mércia, a Eloá, a Maristela. Porque a gente vive neste mundo, só por isso.

E teve gente no site d'O Globo condenando a intervenção do Lula no Irã, já que uma mulher pode ser apedrejada por ter sido condenada em última instância por crime de adultério. (quer fazer algo pra se manifestar contra? tem aqui o link da petição online). Então tá, a partir de hoje só vamos manter relações diplomáticas com países onde mulheres e homens são tratados como equivalentes na sociedade, beleza?



Oi? Não tem nenhum, né? Pois é, nem a Suécia...